segunda-feira, dezembro 19, 2005

107. Os laços e as sombras ( VII )

- Era só o que me faltava, mas a burra sou eu!! Escolho-os a dedo!! – o acre das palavras ecoou para lá dos lábios.

O coração batia descompassado quando o ar frio da noite lhe crivou o corpo de incómodos arrepios. Apetecia-lhe caminhar, perder-se pelos passeios e aventurar-se na noite. Em vez de se dirigir para casa sujeitou-se ao acaso pela calçada deserta. Precisava espairecer e acalmar-se.

- Quem me manda ser otária? – o velho hábito de falar sozinha voltara em força. – Há-os para todos os gostos, de todos os tipos, uns mais desprezíveis que outros, mas todos, do alto da sua presunção, se julgam os maiores.
O telemóvel vibrou no interior do bolso da gabardina.
- Idiotas!! Calham-me sempre os piores. – suspirou sarcástica - Cordeirinhos?! Qual quê?! Despem a pele e não passam de imbecis.

As mãos tremiam-lhe quando segurou o pequeno aparelho. Estava sem paciência para falar com quem quer que fosse mas ao ver que era a mãe foi a razão que prevaleceu. Preocupá-la era a última coisa que desejava.

- Sim, mãe!?
- Olá, filha. Por onde anda a minha menina?!
- Estive no café do tio mas não me apeteceu ir já para casa. Acho que vou jantar no D. Rodrigo.
- Está tudo bem, querida?
- Está. Não te preocupes. Só estou chateada porque o Afonso apareceu no café. – após uma breve pausa continuou. – Mãe, segunda-feira vou à câmara. Está na hora de voltar ao trabalho.
- Tu é que sabes. Só quero que sejas feliz mas pensa bem. Não te esqueças que ainda não recuperaste completamente.
- Os zumbidos e as dores de cabeça já quase desapareceram. O resto só com o tempo… portanto não vejo porquê adiar mais.
- Tu é que sabes. – a voz da mãe soava apreensiva. A filha estava a tentar encontrar uma desculpa para não pensar no Camboja, em Afonso e na Matilde. – Não venhas tarde, está bem?!
- Está. Um beijinho grande e… mãe, gosto muito de ti e do pai.
- Eu sei. Nós também gostamos muito de ti.
Aconchegou o cachecol ao pescoço e enfrentou o silêncio citando baixinho um velho poema que lera algures.

- O silêncio é pó!
Pó que se abeira dos dias,
Se infiltra no coração,
Que como o ódio o corrói!
Não há música,
Não há vida,
Não há sonho,
Só o negrume, cerrado e frio!

O silêncio é pó!
Pó que não se vê,
Se insinua subtilmente...
Quanto muito, se pressente,
Na ponta do pensamento,
Na onda do momento...
Que não se vive
Que não se desfruta,
Que não se imagina, sequer!
Só se ignora, intenso e revelador!

O silêncio é... pó!
Pó... Pó... Pó!! E mais pó!
Tanto... Tanto que dá dó!


Já um sorriso se ensaiava no seu rosto quando o telemóvel voltou a perturbar-lhe os pensamentos. Catarina deteve-se de olhos esbugalhados a olhar para o pequeno écran, ao mesmo tempo que lutava contra o súbito pavor que a assaltara. O seu semblante estava branco como a cal.

- Isto não me está a acontecer!

Negou-se a ouvir aquela voz mas isso não impedia que o desconforto persistisse.
A noite afigurava-se cada vez mais sombria e nenhuma vivalma se avistava. Notou com estranheza que até o vento parecia ter cessado e sem forças para combater a sensação de estar a ser vigiada olhou em redor. Nada. Estava a ficar paranóica. Quase podia jurar que alguém a observava.

- Ohhhhh. – exclamou quando um gato vádio saltou do caixote de lixo.

Acelerou o passo, já faltava pouco para chegar.

- O silêncio é pó?!
Pó que te arrasta.
Pó que te afasta...
(Dos risos, da euforia, da magia...)
Que te transforma em fantasma
Como uma imagem irreal num plasma.
Pó!!

O silêncio é pó?!
Pó... que não tacteias
Mas que se infiltra nas tuas veias...
É ele que te reveste de um negro opressor,
Que te suga a essência e te aniquila!
Pó!!

O silêncio é... pó!
Pó... Pó... Pó!! E mais pó!
Tanto... Tanto que dá dó!

Pó!!


Um carro passou a alta velocidade, no mesmo instante que ouviu a porta de um outro a ser fechada vigorosamente.
Passou-lhe despercebido o vulto que se aproximou por trás dela, por entre as árvores do parque de estacionamento, junto ao restaurante.
O negrume debruçou-se sobre ela sem que se lhe visse o rosto e tudo o que pode notar foi a sombra a descer sobre si.

(Continua...)

Capítulos anteriores:
I II III IV V VI

sexta-feira, dezembro 16, 2005

106. Os laços e as sombras ( VI )

A taça fumegante de chocolate tinha acabado de ser colocada em cima da velha mesa de carvalho quando, cativa do calor que emanava, deixou que os dedos esguios tacteassem o barro.

- Que bom!! – suspirou.

A humidade pairava no ar, não tão densa como aquela que a impedia de respirar quando, no fim da tarde, se sentava no alpendre do bungalow onde vivera durante dois meses. Imaginou que regressava a Siem Reap.
As recordações chegavam-lhe numa catadupa de imagens, que de tão sobrepostas a confundiam. Procurou aclarar a memória e, muito embora o esforço se tenha revelado infrutífero, comprazia-a a doce sensação de ter sido muito feliz Então, porque tinha regressado mais cedo?!

- Porquê?! – o tom era irónico e mordaz – Estafermo!!

Os pensamentos ainda se atropelavam quando o viu entrar.
À meia-luz do canto onde se encontrava quase se percebiam as chispas que iluminaram, repentinamente, os olhos amendoados. A longa melena escondia-lhe a expressão transtornada e os lábios comprimidos.
Contemplou-o enquanto se aproximava por entre as mesas geometricamente dispostas e, contrariada, teve que admitir que o bom gosto de Afonso não o tinha abandonado. Sempre admirara a sua preferência por roupa de corte simples e cores pouco chamativas. O blusão bege contrastava com o castanho das calças e a camisola verde seco deixava antever o branco da t-shirt que usava rente ao corpo; o que contrabalançado com o moreno da pele, o cabelo escuro e os olhos verdes como esmeraldas, a impediam de ignorar a sensualidade que transpirava. Respirou profundamente e inebriou-a um suave odor a lavanda, plantas aromáticas e a madeiras exóticas. Conhecia muito bem aquela fragrância e, mais ainda, a pessoa que habitualmente a usava.

A presença daquele homem insultava-a e exacerbava as emoções que prometera, em vão, controlar.

- Tu!! Como te atreves!?

Amargo e trocista, o riso ecoou no mais profundo das suas entranhas.

- E porque não?! O lugar é público. – disse-lhe enquanto arrastava a cadeira e se sentava. – Não pensaste que poderias fugir tão facilmente, pois não?!

A dor estampada no rosto de Catarina atingiu-o como se um punhal se cravasse na pele.

- Desculpa... Gostava de falar contigo e juntos tentarmos resolver isto.

A revolta mais que a surpresa dominou-a e quando conseguiu falar, o som era gutural como o ribombar dos trovões.

- Não tens nada, absolutamente nada, para falar comigo. – quase sem tomar fôlego continuou. – Se tivesses vergonha, nem sequer estavas aqui.
- Enganaste, minha cara! – a paciência chegara ao limite. - Há assuntos que temos que esclarecer... e não penses que a tua agressividade me assusta, muito pelo contrário, diverte-me. Ficas patética com esse ar de donzela ofendida.

O silêncio pairou sobre eles durante o que pareceu uma eternidade.

- Não te imaginava tão cobarde. – acrescentou.

Catarina ergueu-se de rompante denunciando a intenção de se retirar mas Afonso foi mais rápido e segurou-lhe o braço delicado.

- Senta-te e não me obrigues a fazer algo de que me arrependa! – o tom cortante produziu nela o efeito contrário ao pretendido e, sacudindo violentamente o braço, libertou-se.
- Tu, também não me metes medo!!

Afonso viu-a rodopiar sobre si própria e sair pela porta, altiva e furiosa, quase a correr como se fugisse do diabo em pessoa.
Mais tarde ou mais cedo teria de aceitar conversar com ele. Não poderia esconder-se a toda vida.

- Tem que ter paciência com a menina.
- Mais do que aquela que tenho tido, Sr. João?! – o desânimo e a indignação eram evidentes.
- Os últimos meses não foram pêra doce e ela ainda não se tinha recuperado do primeiro golpe já o segundo lhe era servido a frio e o terceiro estava na fornalha.
- Sabe... não nego que sou culpado mas não do que ela me acusa. Se tivesse um pingo de consciência admitiria que se continuasse no Camboja o pior poderia acontecer. – suspirou como que a ganhar alento. – Uma semana antes de voltar, só por sorte não ficou à mercê de uma quadrilha ligada ao tráfico humano.
- Ela contou-me mas acha que foi só um susto.
- Um susto?! – escarneceu.
- Sim.
- Então digo-lhe mais… Foi bem mais que isso: foi um aviso! Com aquela gente não se brinca. O miúdo que nos alertou foi assassinado como se fosse um cão vadio, sem dó nem piedade e, mesmo eu, vi-me obrigado a viver na sombra até concluir o trabalho. Ela não tem noção...
- Pode até ser, mas...
- ... mas?! Não. Não há explicação para não me querer ouvir.
- Não pense assim. Está magoada, é o que é! Já viu o que ela passou?! Sonhou tanto com a pesquisa e foi o que foi... Depois o acidente que não recorda e como se não bastasse sente-se responsável pela morte daquela mulher. Já para não falar de quando o Afonso se encantou pela Matilde.
- Quanto a isso pouco posso fazer. – encolheu os ombros. – Foi uma estupidez, eu sei, mas pode estar certo de que não sou como o Vasco.
- Oh!! Esse passou por aqui há duas semanas. Vá lá, parece ter tomado rumo. – perante o arquear de sobrancelhas de Afonso, concluiu. – Está outra vez com aquela moça com quem namorou há uns anos e a coisa parece que vai pegar de vez.
- Não lhe perguntou por ela?!
- Perguntou mas não quer dizer nada. – limpou as mãos e, sem saber o que dizer, acrescentou - Acho que nunca pretendeu magoá-la mas a vida dá tantas voltas. O diabo anda sempre à espreita. Mas não se preocupe que a menina gosta é de si.
- Acha?!
- Quer um conselho? Não desista!

Afonso voltou a encolher os ombros enquanto passava a mão pelo cabelo em desalinho.

- Espero que sim, espero que sim, sr. João.

Era em momentos como aquele que o pobre homem se sentia velho e cansado. Não havia modo de perceber os jovens. Antigamente com 30 anos, tinha-se um trabalho de sol a sol e uma família a quem proteger. Era verdade que o orçamento deixava a desejar mas era-se feliz. Catarina tinha 32 anos, Afonso mais dois, ambos tinham vingado na vida, um a dar aulas numa universidade e o outro a trabalhar na câmara. O que lhes faltava?! Se calhar, acreditar na vozita do coração e enfrentar com coragem as dificuldades?! Aprender a lutar pelo que queriam e a dialogar?! Enfim, sabia lá ele... ou eles!

(Continua...)

Capítulos anteriores:
I II III IV V VI

quinta-feira, dezembro 01, 2005

105. Os laços e as sombras ( V )

- Porcaria de trânsito! - o desabafo fundiu-se com a música vibrante que o rádio emitia e que em nada atenuava a ira que o consumia.

Os carros avançavam lentamente e os minutos não paravam de se acumular, irritando-o cada vez mais.

- Maldita seja! – explodiu.

Nas últimas vinte e quatro horas, o seu semblante adquirira um novo rasgo de arrogância, agressivo quase tenaz, que fazia com que os outros condutores não se atrevessem a mais que um fortuito olhar.

A mulher do carro ao lado observou-o. Tinha um perfil marcante: o nariz aquilino, o queixo bem desenhado e os olhos de uma tonalidade clara, talvez verdes, contrastantes com o cabelo negro. O resultado final revelava-se invulgarmente bonito. Só os lábios, contorcidos numa linha tão azeda como o fel, faziam com que qualquer pensamento mais romântico esmorecesse à semelhança de uma flor sem água ou oxigénio. A expressão daquele homem arrepiou-a. Parecia uma bomba-relógio.

O trânsito avançou, compassado, durante alguns quilómetros mas com o aproximar das portagens não tardou a que Afonso suspirasse com enfado. Detestava conduzir naquelas condições. Era impossível ficar indiferente àquele caos.

As másculas mãos crisparam-se, mais ainda, quando um Volvo se atravessou à sua frente e o obrigou a travar bruscamente.

- Otário, vê por onde andas. – gritara-lhe quase sem se dar por isso.

Com os nervos em franja olhou o relógio. Pouco passava das cinco horas e não chegaria se não, na melhor das hipóteses, dali a uma hora.

Regressara mais cedo que o previsto influenciado pelo telefonema, pouco amistoso, que recebera na véspera.
As palavras ainda ecoavam no interior do seu cérebro:

- És um traste. Como é que pude pensar que eras diferente…
- Deixa-me explicar-te. – pedira interrompendo-a.
- Explicar o quê?!?! Não há nada que justifique o que fizeste.
- Há!! Tu sabes disso, portanto não te armes em menina mimada e põe a mão na consciência.
- Como tu fazes...?! Não sejas hipócrita. Eu estava viva, não estava?!
- Estavas, mas todos pensámos...
- ... que nunca recuperaria!? Eu sei! O facto é que estou aqui e não quero mais chantagens psicológicas.
- Estás a ser ridícula...
- Isso é o que tu és quando me mandas flores, escreves bilhetinhos lamechas e pensas que me vais engrupir nos teus joguinhos sórdidos. Esquece. Esquece que eu existo... de uma vez por todas!

O telefone fora bruscamente desligado e Afonso ficara estático, assombrado com a descoberta de que, também ela, não era tão doce como imaginara.
O conflito que se gerara no seu íntimo levou a que cancelasse a palestra na universidade e regressasse a Portugal três dias antes do previsto.
Ali, impotente, cercado por uma imensidão de carros, arrependeu-se. Poderia ter adiado o confronto, ganhar tempo e permitir-lhe arrefecer as ideias. Mas não! Tivera que atravessar a fronteira debaixo de chuva cerrada, pisar no acelerador e esperar que quando chegasse ela estivesse no café do sr. João. Não se sentia com predisposição para lhe bater à porta de casa. Preferia conversar com ela num local minimamente neutro.

A ansiedade dominava-o quase tanto como o exasperava o trânsito, o descontrolo emocional que ela demonstrara e a sensação absurda de culpa.

A cancela foi levantada. Lisboa já se avistava no horizonte.

(Continua...)

Capítulos anteriores:
I II III IV V

terça-feira, novembro 29, 2005

104. Os laços e as sombras ( IV )


- Hoje ninguém sai de casa.
- Está um frio terrível, menina. É o que é! - exclamou o atarracado dono do café enquanto a servia - Só se está bem no quentinho. Tu é que és jovem e tens sangue na guelra... caso contrário também não estavas aqui.
- Obrigada, Sr. João. – disse enquanto aproximava a chávena. - Se calhar devia ter ficado em casa, mas desde que saí do hospital, só estou bem é na rua.

O homem, senhor dos seus sessenta anos, olhou-a carinhosamente.

- Sr. João?! Fui despromovido?!
- Desculpe... – Catarina sorriu – Tio João.

Ele e a esposa tinham nascido no seio de, pequenas e tradicionais, famílias de Trás-os-Montes e os parentes por lá continuavam. Quando vieram viver para Lisboa, os tempos eram outros. Tempos difíceis em que lhes valeu a amizade de um jovem casal, filho da terra que haviam deixado para trás: os pais de Catarina. Se não fossem eles, até fome teriam passado.
João da Rega, como era conhecido, nunca poderia esquecer o que lhes devia. Não era dinheiro mas um bem mais precioso.
O elo perdurara ao longo dos anos e, ainda hoje, eram indiscutivelmente as únicas pessoas, em Lisboa, a quem poderiam chamar amigos.
A pequenita nascera alguns anos depois da intempestiva e aventureira cruzada até à cidade, numa altura em que ele e a esposa já tinham aceitado o destino e o facto de não poderem ter filhos. A afeição que lhe dedicaram era de tal forma que, apesar de entre eles não existir qualquer vínculo sanguíneo, era inconcebível não a considerarem uma sobrinha muito querida.
Quando a vira há uns meses, entre a vida e morte, o coração comprimiu-se e muitas lágrimas derramou com Mariana, a esposa, junto ao leito do hospital.
Chocara-o saber que depois do acidente pouco se recordava da vida que tinha até então ou, até, das pessoas que conhecia.

A voz melodiosa interrompeu-lhe o curso dos pensamentos:

- Não ligue, tio. Esta minha cabeça ainda não voltou ao lugar mas há-de voltar. – piscou-lhe o olho bem-humorado.
- Claro que sim, querida. É só uma questão de tempo e paciência.

João da Rega afastou-se enquanto sorria. A esperança é a última a morrer.

(Continua...)

Capítulos anteriores:
I II III IV

quarta-feira, novembro 23, 2005

103. Nada de nada


Espreito a noite pela janela
E a estrela mais bela,
Enquanto cerco as palavras de fantasia
E dou asas ao pensamento.

Do outro lado da rua deserta,
O eco da alegria,
O vislumbre do vulto
E a antevisão do momento.

O culto oculto é o código
E o código, fruto da lógica ilógica,
Intensa e demorada,
registado em miradas, mais ou menos, profundas,
A verdade que não é denunciada.

O silêncio converte-se em riso
Quando confunde o enredo
E tudo é coragem... nada medo.

Anulo a distância,
Da janela à porta, meia dúzia de passos.
Corre a magia,
Espanta-se a nostalgia
E galopante é a hora, quando me acerco.

Esfuma-se a ilusão,
Instala-se a confusão
E do tumulto que assalta o coração...
Nada de nada transparece.

Criminosa, culpada mas também receosa,
O sorriso surge, por entre os fios dourados,
Sem que se perceba o seu destino...
Na camuflagem das sombras ousa-se,
Esbate-se a máscara
Mas, eis que se não quando, parte...
Parte O vulto...
Fica o vazio da calada da noite
E o regresso à janela...
de onde se contempla a... ruela.

Espero pelo novo dia,
Aquele em que o luar ou a mais singela luz,
Me revela, inebria e seduz...
Aquele em que, de olhos nos olhos,
Sem receios ousarei...
Ousarei abraçar o segundo, o minuto, a vida ou o amor
E murmurar-lhe docemente:

Não partas... Estou aqui!*


* Versos editados a 25 de Novembro, com o intuito de não defraudar quem mantém viva a fé no amor e gostaria que os vultos não partissem.

segunda-feira, novembro 21, 2005

102. Devaneios de uma noite...


A tarde avançava sem nada de extravagante suceder quando o convite surgiu. Uma ida ao Chiado, uma visita à Fnac, a apresentação de um novo livro, Lídia Jorge oradora e um par de horas envolvida pelo mundo mágico dos livros. Impossível resistir.

Desci a Alameda, como quem flutua sobre as águas calmas de um mar tão sereno como o sono de um bebé, e aproximei-me da Baixa já a rasar as 19 horas.
Apressei o passo, na ânsia pura e descomprometida de não perder um único segundo daquele momento que antevia como enriquecedor e aprazível.
Subi as escadas sem sequer fixar a mirada nas pessoas que por mim passavam e quando entrei no recinto sombrio mas acolhedor bebi... bebi as palavras que se desprenderam daquela voz bem colocada e dei asas ao sonho.

Será alguma vez me sentarei naquela cadeira e de mãos nervosas ajustarei o microfone à minha baixa estatura?! Ou me inclinarei sobre a mesa para me desviar da luz de um qualquer foco que me impede de ver os rostos à minha frente...?! Mas acima de tudo e o mais importante, será que algum dia deslizarei os dedos pela capa dura de um livro onde figurará o meu nome, sabendo que haverá alguém com quem partilhar o que, com tanto carinho, criei?! A incerteza estimula a mente e garante a força necessária para continuar a sonhar, que é como quem diz... lutar!

Quando por fim me atrevo a desviar o olhar do palco improvisado dou-me conta da presença de três dezenas de pessoas que, mais ou menos, atentamente seguem o cativante discurso.

Há uns anos tive uma página na internet... Também eu!

Já não a tenho, começou a dar muito trabalho… Eu ainda…

No início o parco conhecimento em linguagem html, javascript e afins limitou-me a criatividade e quase desisti. Muitas foram as horas dedicadas a adquirir os necessários conhecimentos para apresentar um "recanto" que pretendia personalizado.

O pequeno embrião cresceu e hoje assemelha-se a um pequenito que começa a gatinhar. É com orgulho mas também humildade que o digo. É o menino dos meus olhos!
Em formato de blog, na maior biblioteca que o mundo possui, lá está ele. Porque gosto de escrever! Porque gosto de partilhar as palavras, as frases, os contos, as crónicas, os poemas... os rabiscos das horas incertas!

Um ano depois, valeram a pena as muitas horas roubadas ao sono, aos passeios, aos amigos… e quase diria, se me atrevesse a tanto, à vida. Mas não atrevo… porque nenhum minuto foi em vão.
O prazer de saber que algures alguém lhe dedica meia-dúzia de minutos compensa o cansaço que se possa acumular e os momentos de puro lazer que, por ele, foram comprometidos.

Nunca pensei converter estes contos num livro.

Sorri. Sempre gostei de sorrir…e ali fiquei, de pés fatigados e olhos doridos pelas muitas horas em frente do computador. O coração palpitante, a mente aberta e os ouvidos atentos denunciavam o encanto que me envolvia quando, de mim para mim, tecia as mais diversas considerações sobre cada frase que escutava.

Já no fim da sessão comprei o livro, "O amor por entre os dedos", cujo autor /escritor define como sendo um livro de contos narrados num tom inverosímil, por vezes a roçar o non-sense..

Duas ou três horas depois, o livro pousado sobre a mesa de madeira, li atentamente as primeiras páginas e confesso-me culpada deste mau hábito de, mais que ler, analisar.

Se tivesse que elaborar uma recensão talvez focasse o humor e a ironia que sustinham os enredos. Mas, mea culpa, gosto dos floreados das grandes descrições que os clássicos nos apresentam; daquela linguagem ornamentada e rebuscada que ainda persiste nos livros de alguns, poucos, autores da actualidade e que bem era apresentada por Eça de Queirós, Fernando Pessoa, Antero de Quental ou Júlio Diniz… para não me alongar nos sonantes nomes que poderiam ser mencionados a título de exemplo.

Ora, António Manuel Venda, o jovem escritor de quem falo, adopta as palavras simples, e num primeiro impacto, ao mais desatento e "quadrado" leitor, parecerá que lhes falta encanto. Errada conjuntura. Falta encanto a quem as ler impregnado de ideias pré-concebidas sobre literatura. Acuso-me de me ter encaixado nesse perfil mas, votado o estado de espírito menos aberto e tolerante ao descrédito, a verdade é que adorei… adorei aquele conjunto de textos romanceado e bem-humorado; a tal ponto que se voltasse a entrar naquela sala aplaudiria com mais convicção o escritor e o senhor escritor que me recordou que cada livro é um… Livro!

quarta-feira, novembro 16, 2005

101. Euforia


Danço na chuva,
Como quem evoca velhos deuses...
E acredita na estrela cadente
Que rasga o céu e se funde, no horizonte, com o mar.

Danço na chuva,
De olhos postos na chama ardente,
Que brilha para lá da vidraça
E me faz adivinhar os contornos do que é amar...

Ébrio é o momento,
Viva é a emoção,
Enquanto, subjugada ao ritmo, me movimento
E, acaricio a vida, bebendo-lhe os segundos.

Peço um desejo,
Construo um sonho,
E deixo-me levar pelo que antevejo
Ser tão real,
Ser tão intenso,
Ser tão mágico como o teu regresso!!

Danço na chuva...
Não há frio que castre a euforia,
Não há trovão que assuste,
Tudo é magia,
Tão intensa como esta sede de música e alegria!
Tão intensa como o teu sorriso,
Quando debaixo do mesmo céu te murmuro:

Acredita no sonho!!

domingo, novembro 13, 2005

100. São palavras...


São palavras...
E leva-as o vento, a brisa que se desprende da tua voz...

São palavras...
E desfazem-se na espuma branca da praia...

São palavras...
Às dúzias... às centenas...
Letrinhas agrupadas que procuras retratar sem êxito...

Palavras e mais palavras...

São palavras...
Falam de sonhos que são realidade,
De ódio que é amor,
De mentira que é verdade,
De tristeza que é alegria...
Gastas, efémeras, vagas, fruto de outros dias.

São palavras...
Que carregas dentro de ti sem se saber...
Porque cegos estão os olhos e o coração.
Deixa fluir a energia,
É preciso que seja o teu corpo a confessar...
E a por ti falar!
Verás então que não é dor mas fome...
Fome de emoção, de paz e de magia,
O que te vai na alma.

quinta-feira, novembro 03, 2005

99. Palavras soltas


Vida. Rumo.
Paz. Fumo.
Amizade. Felicidade.
Gato. Cão.
Fado. Ilusão.
Criança. Esperança
Silêncio. Brisa.
Mar. Amar…


Suspiro levado pelo vento
Nas horas que invento
Enredos, encantos tamanhos,
mágicos fragmentos da inspiração,
Que não possuo mas ouso denunciar!
Acreditar! Ver!
Sentir como se pressentir fosse a valer
E, afinal… sorrir, serena na leda madrugada
Em que mais que dormir, foi escrever
O verbo que se impôs, que se quis, que se embalou!

Vida. Rumo.
Paz. Fumo.
Amizade. Felicidade.
Gato. Cão.
Fado. Ilusão.
Criança. Esperança
Silêncio. Brisa.
Mar. Amar…


Assim são as palavras soltas…
Das noites de voltas e mais voltas…

Assim sou… Eu!!

98. Inverno



O rigor do Inverno desce a rua
Abraça a árvore nua…
Sem sequer a fitar!


Revejo-te nela, quando sorris
E bebo o calor das tuas palavras,
Numa ânsia desmedida de recuperar o cálido fôlego.

Na verdade pura… crua…
És tu e só tu… quem desbrava a calçada,
Fustiga a intempérie,
E acarinhas um corpo frio, hirto…
A quem chamas Amor.

O sonho contorce-se à esquina.
Delira a ilusão.
Quem se aproxima é a dor…
Dor de saber gelado o coração.
Dor de conhecer o estado da alma.
Dor de pressentir distante o pensamento.

Inverno que é Verão,
Verão que é Inverno.
Brisa que não é vento,
Vento que não é brisa.
Velas que são trapos,
Trapos que são velas.
Eu e tu, numa viagem sem volta,
Onde nunca embarquei,
Onde não sentiste mais que revolta.

Sonho…
Invento…
Deliro…
Qual de nós o quente e o frio?!
O verdadeiro e o falso?!
O fiel e o traído?!
O seduzido e o sedutor?

Eu e tu, duas peças de um puzzle
Infame, irreal, obsoleto…
Onde nunca percebi pertencer.

Sorris, lábios contorcidos.
Sentimentos adormecidos, quiçá esquecidos
No momento em que te deixas abraçar
E te sabes não amado.

Quebra-se o encanto!

O rigor do Inverno desde a rua,
Abraça a árvore nua…
Sem sequer a fitar!


Desço-a…
O soluço paira já no ar,
Quando os meus olhos te confidenciam…
Não te posso amar.

terça-feira, novembro 01, 2005

97. Os laços e as sombras ( III )

- Não podes recusar! – Repetira-lhe Matilde

Perante o ar aparentemente indiferente de Catarina insistiu:

- Quantas vezes te ouvi dizer que se a oportunidade surgisse não a recusarias. Há quantos anos esperavas por isto?!

Encolheu os ombros e rodopiando sobre si própria olhou pela vidraça da janela.
O dia amanhecera estranhamente calmo, sem que pudesse adivinhar o emaranhado de indecisões que a levariam quase à exaustão, horas mais tarde.
Se o convite tivesse surgido há um ou dois meses teria aceite sem hesitar mas, naquele espaço de tempo, muita água correra debaixo da imponente ponte pombalina.
A copa das árvores balançava, suavemente, abrigando do sol meia-dúzia de barulhentos
pardais, animados frequentadores do parque.
Suspirou e encolheu os ombros, remetendo-se a um pesado silêncio.
Sentia-se numa encruzilhada e tinha por hábito escolher o trilho mais hostil. Os desafios sempre tinham sido sedutoramente estimulantes e este apresentava-se grande de mais para ser recusado. Essa era a verdade.
Aceitá-lo revelar-se-ia no concretizar de um sonho.

O convite surgira pela mão de um conhecido de longa data, também ele sociólogo.
Afonso fizera o doutoramento na Universidade de Salamanca e, pelo que sabia ficara, desde então ligado a vários projectos de investigação.
Apaixonado e empolgado, com este último que lhe fora proposto, não hesitara em avançar. No entanto, consciente de que seria impossível realizá-lo sozinho, ocorrera-lhe, ser ela, a assistente ideal.
Conhecia o seu percurso académico e o profissional, até as ambições e, mais do que isso, adivinhara que a personalidade aparentemente serena e doce escondia a determinação e a coragem necessária para arriscar e com ele abraçar o desafio. Será que se enganara?!
Uma semana antes de lhe mencionar uma única frase sobre o assunto, já o seu nome tinha sido proposto à equipa de catedráticos responsável pelo departamento e aceite. Restara-lhe, então, convencê-la.

Estudar o pós-guerra no Camboja, a influência que a trágica guerra do Vietnã tivera sobre a população e a reconstrução da própria sociedade... era aliciante.
Do pouco que sabia, o país tinha sido no passado um importante império khmer. A edificação da magnífica cidadela de Angkor Ton datava do apogeu desse período e seria precisamente lá, onde se verificava o expoente máximo do turismo cambojano que iniciariam a pesquisa.

Nos últimos dias tentara absorver o máximo de conhecimento sobre o território que se lhe afigurava demasiado hostil para ser real. A sede de saber impelia-a a assistir incontáveis filmes e documentários, a ler qualquer registo histórico do que era passado e presente e até a realizar inúmeras pesquisas na internet.
A imagem das minas terrestres sobrevoava a sua mente ininterruptamente.
Quantos anos demorariam ainda para que não restava uma única?! Cinquenta... sessenta?! Acreditava-se que seria um longo e interminável século.
Suspirou enquanto recuperava fragmentos do que lera sobre o assunto. A guerra... o genocídio, as minas... a opressão e, agora, a precária estabilidade política, condenavam aquele povo irremediavelmente a níveis horripilantes de pobreza.
Dos onze milhões de habitantes, oitenta por cento estavam em zonas rurais e dedicavam-se à agricultura. Acreditava que seriam estes, a grande massa populacional, que estava em perigo iminente e também aqueles que ditavam os tão preocupantes níveis de analfabetismo e turismo sexual.

Afonso alertara-a para os perigos que correriam se não se restringissem a cumprir a orientação dos guias e para a ofensiva realidade com que se defrontariam.
Adultos e crianças mutilados eram vistos por toda a parte e mesmo passado tantos anos o peso da opressão ainda era sentido. Os turistas limitavam-se a percorrer as bonitas cidades de Siem Reap e Phnom Penh, a capital. O perigo espreitava a cada passada dada para lá das cidades e das estradas. Por mais fascinantes que se afigurassem as florestas tropicais havia que resistir à tentação. Qualquer passo em falso poderia ser fatal.

- Vamos beber um café?! – sorriu timidamente à expectante Matilde.

- Vamos... mas promete-me que não tomas nenhuma decisão precipitada.

- Prometo. Nunca o faço. – a voz de Catarina assumiu um tom grave e ambíguo.

- Também não penses de mais! – retorquiu-lhe efusivamente a amiga.

O bom humor imperava apesar de pairar no ar uma inflamada tensão.

A mente de Catarina fervilhava de ideias e imagens. Os pais, os amigos, o gato... até a bicicleta, a praia, o carro, ou o café da manhã junto ao Tejo a fizeram sentir uma antecipada sensação de saudade.
Noventa dias... afinal, seriam apenas três meses num país distante... com uma realidade que a atingia e sensibilizava como nenhum outro.

Algo nas suas entranhas vibrou.
Por mais que lutasse contra si própria sabia que não tinha como recusar e, ante esta sentença que o seu espírito lhe ditava, a latente força interior foi expelida sobre a forma de destemidas palavras:

- Sabes que mais?! Vou aceitar!

A partir daquele momento tudo ocorreu num ápice. Poucos dias depois a licença sem vencimento tinha sido entregue e aceite, a viagem estava reservada e informadas as pessoas que lhe eram mais queridas.

Catarina e Afonso haveriam de pisar o solo cambojano e, constatar a mística influência das monções, nos seus temperamentos habitualmente controlados.
Para já, a euforia que os contagiara era mais intensa que o habitual; ao ponto dos próprios amigos não lhe conseguirem ficar indiferentes.

O dia da despedida aproximava-se. Dali a dois dias entrariam no avião e nenhum livro, revista ou documentário os preparara para o que viveriam.

No dia anterior tinham saído com amigos comuns. Teria sido uma noite como tantas não fosse o clima de excitação e o facto de Catarina ter visto de relance Vasco.
Surpreendera a sua presença no preciso momento em que se ausentava.
A nostalgia que então sentiu contrastou com a alegria do momento.
Assaltou-a uma miscelânea de emoções e chocou-a olhar para ele como se não passasse de uma personagem de um qualquer filme ou um vulto numa fotografia desfocada.
Há meses que nada sabia de Vasco ou Juliana, nem sequer lhes tinha dedicado mais do que, um ou outro, esporádico segundo.

Olhou a linha do horizonte, sentada na areia dourada, sacudiu a densa melena que lhe envolvia o rosto e quedou-se imóvel a aguardar os pensamentos que se seguiriam.

Quase sentia pena de Juliana a quem a vida, os desgostos e a frustração transformaram de forma tão negativa. Acreditava que a sua essência não seria tão má como aparentava mas a falta de princípios era demasiado marcante para ser ignorada.
Suspirou tomando consciência de que aquela mulher nunca mudaria e jamais seria verdadeiramente feliz.
E Vasco?!
Sorriu...
Muito demoraria até que aquele menino em corpo de homem se apercebesse que o mundo existia para lá do seu meio-metro quadrado mas o dia chegaria.
Esperava que fosse feliz tanto quanto ela o seria.
A nenhum dos dois guardava rancor mas do amor que, no passado, lhes dedicara também nada restava.
O tempo encarregara-se de lhe demonstrar que nada acontece por acaso...

Semicerrou os olhos e inspirou o ar puro, extasiada com o cheiro a mar, a vida, a esperança...
As recordações esfumaram-se como que levadas pelas ondas de espuma branca e no seu íntimo algo estremecia... docemente. O passado expirava.

Cercava-a uma tranquilidade sem limite quando a pressentiu que alguém se aproximava. Ergueu o rosto vagarosamente...

Há anos que se conheciam mas naquele instante parecia-lhe que o via pela primeira vez: Os traços exóticos do rosto, o andar pausado, o cheiro inebriante da água de colónia e aquela vincada personalidade...
A inesperada consciência do homem que era provocou-lhe uma estranha e embriagante excitação. Tão possante quanto tentadora!

- Afonso...

Sorriram... Nenhum dos dois poderia continuar a esconder aquela certeza que brotava do mais profundo das suas almas: Depois daquela viagem aguardava-os um novo e sensual rumo...

A centelha do amor principiara a renascer das cinzas...

(Continua...)

quarta-feira, outubro 26, 2005

96. Os laços e as sombras ( II )

O fim-de-semana findava como começara: lá fora a chuva teimava em cair.
Displicentemente recostado no confortável sofá, Vasco, susteve o fumo compacto, no calor dos pulmões cansados, permitindo que a nicotina o inebriasse. Olhou atentamente o cigarro e repetiu-se uma vez mais... tinha que parar de fumar.
O exagero tinha um motivo e ele não o ignorava.
O tabaco entorpecia-lhe os sentidos e ajudava-o a abstrair daquela sensação, de vazio e culpa, que não insistia em não o abandonar mesmo depois de...

Suspirou.

Porque insistia a sua mente em recordar a doçura, o cândido carinho, intenso e desprendido, daqueles olhos, daquele rosto e daquele corpo?!
Naquela manhã quando acordara o seu primeiro pensamento fora para ela, tão impulsivo e avassalador que, a sua respiração ficara entrecortada, o coração batera mais forte e a nostalgia não se coibiu de o abraçar devolvendo-lhe rastos de emoções bem menos deprimentes.
Na verdade fora um erro!! Um erro arriscar e, um erro fugir depois de o ter feito. Mais ainda, não ser forte o suficiente para resistir a instintos primitivos e básicos, traí-la e expulsá-la da sua vida sem que tivesse coragem para abrir o coração...

Depois dela mais nada... teria aquele mágico sabor a sonho e a vida.
Como tardara em perceber isso. E agora...?! Agora ela fugira-lhe por entre os dedos, tal qual areia ou água. Talvez para outros braços... Seria possível?!

Recordou-a. A rebeldia sensual que tanto a caracterizava atingiu-o como um soco no estômago vazio.
Angustiava-o saber que, afinal, perdera muito mais do que antes previra ou pressentira.
Juliana era apenas, um corpo longe de ser belo, um afago roubado na contagem imprecisa do tempo e da noite, numa daquelas horas em que, mais que emoções, é o destilar do álcool que o move.

Sacudiu a cabeça. Quem escolheria uma pedra de carvão se pudesse ter um diamante?! Apenas ele...

Rodopiou o copo entre as mãos.
O cigarro há muito que fora apagado no cinzeiro repleto de beatas.

Remoer o passado não mudaria o rumo dos acontecimentos, não a faria regressar ou o levaria até ela.

A culpa estava intrincada em cada poro da sua pele e envergonhava-se da cobardia que o manifestara.
Queria amadurecer, abandonar aquela irresponsável conduta de quem se deixa guiar em nome de um ego que de nada... se convertia em nada!
Queria libertar-se das amarras do que ficara perdido lá atrás, nos anos em que transformara a ilusão no seu porto de abrigo e fazer renascer das cinzas a esperança. No entanto, como se pode vencer o desânimo de quem não se atreveu a lutar e viveu as histórias que não leu mas que ouviu contar?!
Catarina... poderia ser apenas um nome sem rosto, sem alma nem coração... todavia era uma força viva que continuava a impregná-lo de emoções e sentimentos que não ousava nomear, por mais evidentes que fossem.
Suspirou. Talvez o tempo esbatesse a noção exacta do que se negara a aceitar... e ofuscasse a deprimente sensação de perda. Talvez acalmasse o coração e lhe devolvesse o ânimo... Talvez!
Semicerrou os olhos e quedou-se imóvel a contemplar um ponto indefinido da sala, numa espera monótona e incongruente com o mais profundo dos seus desejos. Que passassem os segundos, os minutos, as horas... que se apagasse a memória e se danasse tudo. Inclusive ele.

O Big Ben marcou o compasso. Passaram mais que horas... semanas... meses...
Rodeou-se de amigos para quem era uma espécie de rei. Vieram os primeiros e espontâneos risos, noites loucas em que o ritual se mantinha, sem que uma vez que fosse inibisse o corpo de se deixar seduzir pelo vulgar jogo de Juliana, e quase... quase acreditou estar a salvo daquela aura mágica, tão rara quanto uma pedra preciosa, que um dia o abraçara com verdade, com carinho... com amor...

O frio atenuara-se e, mesmo quando o negrume descia sobre a cidade, a temperatura era amena.
Aqui e ali, começava a observar-se a movimentação de pequenos grupos.
Naquela noite, reunira-se com os amigos de sempre num dos bares que ladeava a praia... O tédio da rotina instaurada e da vida sem qualquer delineado objectivo era insustentável. Esgotadas as forças já não tinha como continuar a ignorá-lo.
Olhou os rostos conhecidos que o cercavam. Sentiu-se como se os visse pela primeira vez ou se de repente as máscaras tivessem ruído. Enojou-o o que encontrou. Uma ou outra excepção era tudo o que lhe restava.
Ergueu-se da impessoal e desconfortável cadeira e encaminhou-se até ao bar.
Foi quando a viu...
O vestido branco moldado ao corpo bem torneado, o cabelo solto sobre os ombros protegidos pelo leve tecido de algodão e o rosto... O rosto tão doce e sereno como o recordava.
À distância bebeu-lhe o sorriso e as palavras que não ouvia mas adivinhava pelo, lento e sensual, movimento dos lábios.

Um arrepio percorreu-lhe o corpo... Catarina...

Por breves instantes recuou no tempo. Imaginou-se a envolvê-la nos braços e a sentir o inebriante calor do beijo que tantas vezes fora partilhado... Quase sentiu as suas mãos a estreitar a delicada cintura e a sua respiração cálida, tão suave como uma carícia. Reviu-se a protegê-la dos olhares menos inocentes e a olhá-la com admiração.

Cerrou os olhos, impressionado com o rumo dos seus pensamentos, extasiado com o mar de emoções que o assaltavam e prostravam sobre terra a convicção de que nada restava...

Não... !!
O passado era passado...

Afastou-se sem que ela pressentisse a sua presença e, sem sequer questionar a sua atitude, encaminhou-se para a rua...
Fugir não era uma opção mas o recurso para sanar aquele mal que, tão ferozmente, o ameaçava.

Vasco vivia do ego das pequenas e fúteis conquistas, dos “amigos” que como abutres se abeiravam dele, das amarras ao passado em que sofrera e ao conforto de uma vida fácil onde bastava querer para ter.
Não passava de uma criança carente, sedenta de atenção, num corpo de homem. Um rei... sem reino, refugiado num castelo sem alicerces, construído no meio de nenhures.

Que poderia ele oferecer a alguém como ela?! Não a traíra já mesmo no calor da paixão? Ou teria sido apenas um desafio... que depois soubera não vencido?!

Há mistérios que o coração e a mente não poderão, jamais, descortinar.


(Continua? Talvez...)

terça-feira, outubro 25, 2005

95. Os laços e as sombras ( I )




Um riso cristalino ecoou pelo vale enquanto pequenas gotas de suor deslizaram pelos contornos do rosto feminino. A roupa leve colava-se ao corpo moldando-se a cada curva delicada e sedutora...
Deitada na relva fresca que ladeia o pequeno riacho, Catarina, contemplou as nuvens que calmamente passavam; imaginou que se transformara numa e deixou que o pensamento flutuasse ao sabor do vento.
A caminhada matutina deveria ter esgotado toda a sua energia mas, ao invés disso, parecia ter actuado sobre si de forma revigorante.
Inspirou o ar puro e de um único movimento ergueu-se. Sentia, no seu íntimo, uma paz, doce e serena... como se tudo nela estivesse em profunda harmonia com a natureza que a cercava. O chilrear dos pássaros, o som de água a cair... o próprio vento... tudo a fascinava. Até o trilho que se estendia à sua frente, íngreme e irregular.
Sorriu-lhe, como se de um humano se tratasse, desafiando-o a fazê-la desistir.

Pé ante pé, a jovial jornada foi retomada.

O suspiro veio, involuntário e quase inaudível.

Por fim poderia permitir que a recém-terminada relação com Vasco lhe voltasse à lembrança. Estranhamente, tudo se afigurava como uma ténue recordação, breve e desfocada. Gostar dele tinha sido uma novidade, na vida de reclusão que tinha há anos. Saboreara esse sentimento com prazer e alegria. Agora sabia...!! Continuava a ter essa mágica capacidade de sentir!!
Com o fim prematuro do episódio os amigos esperaram lágrimas, revolta... tristeza mas nada disso viera. Tudo era alegria, serenidade e encanto. Ninguém jamais entenderia aquele ímpar estado de espírito! Só ela, a quem parecia tão fácil e banal controlar o coração. Vezes havia em que se questionava porque assim era. Porque se sentia sufocar a cada despertar... quando estendia a mão e aquele corpo quente a abraçava?! Porque se sentia enfraquecer a cada olhar partilhado?! A cada palavra dita?! A cada encontro?! Teria, realmente, gostado dele?! Gostaria ainda?! Quantas perguntas sem resposta com as quais não se preocupava, simplesmente porque não lhe apetecia desperdiçar o tempo em considerações que não a fariam evoluir!!
A verdade é que, para ela, o amor não passava de uma ilusão criada pelo homem para justificar a necessidade de não estar só! Para ela, a felicidade estava em momentos como aquele em que, tal como uma criança, corria pela vereda ladeada de giestas e urzes... Tudo o resto deturpava-lhe a visão... oprimia-a e tornava-a infeliz!
Sorriu... comparando-se a um felino que desfalece quando enjaulado! Ela era assim! Um ser que buscava prazer nas pequenas coisas da vida e amor nos olhares embevecidos da família e dos amigos. Isso bastava-lhe! Por enquanto...

Avistou o açude a uns metros de distância e quando, por fim, se aproximou da orla daquele, pequeno e paradisíaco, recanto não resistiu.
O lugar era isolado e perfeito para se aventurar a refrescar a pele húmida.
Como uma lebre, astuta e atenta, perscrutou o silêncio sussurrante da natureza. Despiu a roupa e submergiu na água cristalina.

Há muito que não se sentia tão livre... e tão feliz.
Inesperadamente, do mais profundo da sua essência, como que a contradizê-la, surgiu a imagem de Vasco e Juliana. Juntos...
Como pudera ser tão tonta?! Traída pela segunda vez por aquela mulher a quem chamara de amiga... ?!

Emergiu energicamente da água para, tal qual um exímio ser aquático, voltar a submergir.

Que se danassem todos!! Ela estava bem e se alguém perdera não fora ela. A força daquele pensamento esgotou-lhe o fôlego e, num único impulso, voltou à tona da água. Durante largos minutos quedou-se a boiar limitando-se a esvaziar o pensamento e deixar que o instinto a guiasse.

Esfriara. Chegara o momento de deixar de imaginar que de nuvem se transformara em peixe.
Infelizmente, tinha que voltar ao mundinho de sempre... onde as pessoas são por vezes demasiado egoístas, mesquinhas e... muito pouco inteligentes.
O rosto contorceu-se numa careta divertida, ao mesmo tempo que, se delineou um sorriso cínico nos lábios, habitualmente ternos. A vida era assim... que podia fazer!?

Pela segunda vez o mesmo pensamento voltou... Que se danassem todos!

Meia-hora depois, era com pesar, que retomava a caminhada e abandonava o cantinho de céu em que desfrutara a mágica sensação de não existir mais nada... que não ela e a natureza.

Regressava, exausta mas convicta de que dos dias sem data guardara, o melhor, a noção exacta de que passara por eles sem mácula.
Mais tarde ou mais cedo, a vida... ou os sonhos, ou tão-somente o destino, haveria de a recompensar das horas em que se esquecera de sorrir.

Mais tarde ou mais cedo... Um dia, talvez, já a espreitar o horizonte...

(Continua?! Talvez...)

terça-feira, agosto 30, 2005

94. Algo acontece...

Algo acontece quando nasce a manhã,
Quando desponta o sol
E do sorriso nasce a vida!


Quero voar,
Sentir e acreditar!!
No dia que é amanhã,
Na frenética energia…
Do sonho, que vai além da ilusão,
Serenamente saborear…
Infinita e etérea, a magia
Do doce despertar!

Algo acontece… quando nasce a manhã,
Te abraço e me deixo acarinhar…
Tal qual um amante faria!

Algo acontece… quando desponta o sol,
E os olhos brilham cintilantes!
Inesperadamente, nada resta do antes…
Tudo é volátil!
Tudo é fugaz!
No entanto, a excepção existe…
O sorriso de quem sabe…
Sabe como é o aroma!
Sabe como é o cheiro!
Sabe como é o toque!
Da força de ser mais que mortal… eterno!!

Do riso nasce a vida,
o sonho, o amor, a paixão,
o conto, o poema, a canção,
a alegria, o encanto e eu… Tu!

sexta-feira, agosto 05, 2005

93. Pó!!

O silêncio é pó!
Pó que se abeira dos dias,
Se infiltra no coração,
Que como o ódio o corrói!
Não há música,
Não há vida,
Não há sonho,
Só o negrume, cerrado e frio!

O silêncio é pó!
Pó que não se vê,
Se insinua subtilmente...
Quanto muito, se pressente,
Na ponta do pensamento,
Na onda do momento...
Que não se vive
Que não se desfruta,
Que não se imagina, sequer!
Só se ignora, intenso e revelador!

O silêncio é... pó!
Pó... Pó... Pó!! E mais pó!
Tanto... Tanto que dá dó!

O silêncio é pó?!
Pó que te arrasta.
Pó que te afasta...
(Dos risos, da euforia, da magia...)
Que te transforma em fantasma
Como uma imagem irreal num plasma.
Pó!!

O silêncio é pó?!
Pó...mais que ínfimas partículas que não tacteias
Mas que se infiltram nas tuas veias...
É ele que te reveste de um negro opressor,
Que te suga a essência e te aniquila!
Pó!!

O silêncio é... pó!
Pó... Pó... Pó!! E mais pó!
Tanto... Tanto que dá dó!

Pó!!

sexta-feira, julho 22, 2005

92. Crónicas...

Será a vida injusta!? A mim, sempre me pareceu que não... mas, então, como se explica que um inocente seja assassinado, ao virar da esquina, sem qualquer motivo aparente que não o estar na hora e local errado?! Ou que aquele outro ser que sempre teve uma vida saudável se veja, inesperadamente, atado a uma cama porque um cancro de que é portador assim o exige?! Ou...
Há anos que defendo que temos a vida que fazemos por ter... Uma ou outra vez esta convicção foi abalada no entanto, apesar dos vários ataques, persistiu até há dias. Agora... passei a acreditar que somente se controla meia-dúzia de condicionantes. O resto... Sabe-se lá...!! Será obra do acaso!! Um acaso que pode ser de uma tenacidade atroz, devastadora que nos arrebata a esperança e a serenidade. Não me quero dar por vencida. Nego-me a afastar o olhar do fundo do túnel onde, ainda, vislumbro o rasto de um raio solar. Esta teimosia poderá parecer infantilidade, ou imaturidade, ou ilusão... mas se deixar de acreditar é morrer eu prefiro crer no pontinho cintilante que mais adivinho do que contemplo! Porque não o havia de fazer?!
Volto a folhear o caderno já muito manuseado e releio cada uma das palavras escritas ao despontar da noite. Desta vez, não era mais um conto, uma crónica, uma simples opinião ou um poema, mas uma carta. Sim!! Algo tão simples como uma carta... escrita a um ente querido. Provavelmente nunca será enviada... Ninguém a lerá. Nem sentirá a textura do papel, o seu cheiro característico. Nem se comoverá com cada uma das suas palavras. Ainda assim, a emoção que delas brota é tão intensa como o cheiro a pinho que tantas vezes senti entrar pelas narinas... quando ainda menina corria pela serra remexendo a caruma para procurar tortulhos. Tantos foram os anos que passaram desde então, tantos dias desperdiçados na azáfama da cidade, tantas vezes adiada a visita...
Porque só nos lembramos de tudo isto quando o negrume da noite parece bater à porta?! Porque nos esquecemos de dizer o mais importante?! E nos tornamos tão egoístas?!
Será fraqueza dizer "gosto de ti"?! A mim, sempre me pareceu que não... mas poucas vezes o disse... Urge, agora, fazê-lo, esperar que não seja tarde e que não seja só eu a acreditar que amanhã nascera um novo dia, melhor que este, certamente!

quinta-feira, julho 14, 2005

91. In Kulto ao Campo das Cebolas

InKulto... será quem, este verão, não (re)descobrir o bonito espaço situado, nos números 4 a 4c, na Rua dos Bacalhoeiros ao Campo das Cebolas. O edifício que albergava o extinto Galloping Hogan’s serve agora de porto de abrigo a todos quantos se deixarem seduzir pelo recém inaugurado bar-restaurante.
Carlos Rocha assume a gerência acompanhado por Olavo Bilac na direcção artística e Marina Santiago como relações públicas.

Aberto ao público desde 16 de Junho apresenta uma decoração que conjuga, com sublime perfeição, as linhas medievais do edifício com mobiliário moderno. Dos móveis escuros que outrora lhe adornaram os recantos e que tinham sido importados da Irlanda pouco restou. É verdade que eram verdadeiras obras de arte, mas o novo rosto surge consideravelmente mais arejado, menos taciturno e com um incontestável bom gosto. Como se poderia evitar concluir que a mudança foi positiva?!
Tons de amarelo, vermelho, castanho e preto fundamentam ainda mais essa constatação, na medida em que dão ao espaço uma nova dimensão, romântica e acolhedora, sem desprezar o espírito de festa que por lá se pressente.
Desde já, promete ser um dos futuros espaços “in” da bonita capital portuguesa.
Da conversa com Marina Santiago ficou a saber-se que o primeiro piso se mantém a funcionar como restaurante, com horário alargado até ás três horas da madrugada. O rés-do-chão, o bar, encerra ás quatro horas e é precisamente aqui que acenta o trabalho de Olavo Bilac.. Diariamente, o In Kulto apresentará música ao vivo, teatro, stand up comedy e exposições.
Como o diz MS “estamos a começar...” mas já se antevê o brilho mágico das noites bem passadas, num ambiente verdadeiramente cativante como o é, também, a simpatia do staff.

Um sorriso, um discurso alegre e profissional, um magnifico café e uma decoração soberba... quem não os apreciará?!

In Kulto... Inculto?! Nem por isso! In culto!

Recomenda-se uma visita! Adira ao culto mais in da capital, aquele que alia bom gosto, espectáculo e um convívio, francamente, saudável.

In Kulto!!

In Kulto
Rua dos Bacalhoeiros 4
1100-070 LISBOA
(Campo das Cebolas, junto à Casa dos Bicos)
218862395
inkulto@sapo.pt

sexta-feira, junho 24, 2005

90. Eugénio de Andrade



Como se vence o amor?, perguntavas
o sorriso brincando ao sol com as romãs.


Como se vence a morte?, questionavas
o olhar atirado à vida com nostalgia,
num excelso esforço de quem já pouco acredita...
num desaire desmedido de quem, ainda, ousa sonhar!
Mas veio a penumbra,
O negrume atroz não desejado!
Foi-se o sopro vital
Que te sustinha neste mundo mui amado!
Fica, agora, a memória...
Refúgio de mil lembranças desta tua existência.
Perdura a força das horas contadas...
Com vigor e paixão,
As letras agrupadas...
Num poema, num soneto, numa simples estrofe,
Algo de concreto,
De mágico e eterno!
É verdade! Nenhuma onda apagará a sua marca da praia.

Os anos hão-de passar
E, do grande livro que é a vida, há-de ficar...
O registo fiel de uma relação
Luminosa, sublime, intemporal,
Um acorde poético,
De palavras interditas ou não
Mas que algures brotaram da tua essência
Com a fúria de um fogo intenso...
Com a calmaria que sucede a tempestade.

Eu sei... Tu sabes...
Muito depois de teres partido
a tua voz continuará a ecoar dentro de nós:

Boa noite. Eu vou com as aves...
num voo rasante e lascivo
sobre esta terra que amo e deixo...
com saudade e sem vontade!
Até logo... Até amanhã... Até sempre!!


(Singela homenagem ao poeta e ao homem. 13 de Junho de 2005)

sábado, junho 11, 2005

89. Férias...

Este cantinho não está esquecido apenas de férias.

Um beijinho a todos os que lhe dedicarem meia dúzia de minutos.
Maria

quarta-feira, maio 25, 2005

88. Feira do Livro

Um ano depois procuro-te com aparente indiferença por entre o arvoredo. Admiro-te de longe, certa que a tua presença se impõe... me atrai como um íman e não tenho como fugir. Nem sequer urge que o faça. Estás ali... Percorro a pequena distância que nos separa de sorriso nos lábios e tão serena como sempre. Não tenho pressa, muito menos me subjuga qualquer condicionalismo temporal, físico ou psicológico. Deixo-me dominar pela atmosfera feérica que te envolve. Deslizo os dedos pela bancada pintada de branco. Seduz-me o colorido de que se reveste a tua imagem, o calor dos murmúrios e a alegria que paira no ar. Relembro, ao acaso, os nomes de mil autores... outros tantos títulos. Troco meia-dúzia de palavras com os vendedores, outros tantos sorrisos com quem num idêntico impulso se aproxima de ti e procura o mesmo tesouro. Volto a sentir-me criança. Imagino-me a Alice no País das Maravilhas enquanto, neste fim de tarde, percorro o Parque Eduardo VII com a sensação de reencontrar uma amiga de longa data.
Os minutos passarão e horas mais tarde, quando te diga adeus... terei adquirido dois ou três livros, na melhor das hipóteses. Certa de não resistir a abraçar-te uma vez mais, não te direi até para o ano... mas até breve!

Sorrio...


A Feira do Livro de Lisboa celebra este ano o seu 75º aniversário e decorrerá de 25 de Maio até 13 de Junho. Realizada no bonito Parque Eduardo VII terá expostos livros para todas as idades, autores para todos os gostos e preços para todas as bolsas.
217 pavilhões, 131 Editoras aguardam pela nossa visita. Não deixe de o fazer.

Horário:

Segunda a Sexta às 16:00 horas;
Sábados, Domingos e Feriados às 15:00 horas.
No dia 1 de Junho (Dia Mundial da Criança) às 10:00 horas.

Domingo a Quinta-feira às 23:00 horas;
Sextas-feiras, Sábados, vésperas de Feriado e último dia da Feira às 24:00 horas.

domingo, maio 22, 2005

87. Vermelho, vermelhão...
Benfica campeão!



As buzinas dos carros ecoam pela cidade... pelo país inteiro. Há foguetes a ser lançados, garrafas de champanhe que são abertas e suspiros de alívio. Os risos e a alegria imperam em todos os lugares onde estiver um benfiquista e não há como evitar reconhecer que são campeões... Sim! Campeões que tiveram a sorte de ganhar alento com os primeiros jogos dos adversários, verdadeiros desastres, e de terem acreditado que podiam chegar onde chegaram. Nem tudo terá sido sorte mas nem tudo terá sido mérito. O certo é que sem qualquer tipo de falsidade lhes dou os parabéns.
São dez anos de sofrimento brindados com uma festa que me recorda a euforia vivida durante o Euro.
Sou sportinguista... sempre o serei! Gostava que a cor desta noite fosse outra... mas isso não me impede de ficar nostalgicamente feliz. Não pelo Benfica mas por todos quantos hoje saíram ás ruas e dão largas ao seu contentamento.
O que me sensibiliza não é o vermelho, nem a águia, mas a união de uma massa humana que esquece as dificuldades diárias e vive o momento em plena felicidade. Fosse sempre assim e, certamente, o nosso fado seria outro...

Parabéns, Benfica!

Amanhã será um novo dia... outros campeonatos haverá!

quinta-feira, maio 19, 2005

86. Sonhar e lutar...crescer!



Serena, ainda que exultante,
Percorro os meandros da mente
Numa busca constante,
Precisa e perspicaz, que me permita crescer!

Sorrio...
Há sorrisos de todas as cores, formas ou feitios,
Só a eterna sensação de paz perdura
Na profundidade do meu ser!

Exultante ainda que descontente,
Não me dou por vencida...
A vida é bela!

Cada dia é um capítulo por escrever,
Cada sonho um barco que navega
E a bom porto há que levar.

Rir, viver, amar... respeitar,
São alguns dos verbos que me assaltam...
Nesta hora imprecisa
De uma qualquer noite, mágica e mística!

Fala-se de amor...
Por mim... por ti... por nós... por vós...
Por quem luta diariamente, por vencer a dor,
E retirar de cada momento o melhor:
Aprender e evoluir!

Serena, ainda que exultante,
Exultante ainda que descontente,
A felicidade envolve-me e inebria-me
Fazendo-me acreditar
E sorrir ao relembrar
O importante que é lutar...
Pelos sonhos que nos movem!

sábado, maio 14, 2005

85. (Re)encontros



O dia finda quando Matilde se resolve a delinear as primeiras palavras... A carta é escrita ao sabor da emoção e, ainda que possa parecer fruto de um fugaz devaneio, o amor que a consome é eterno...

A ti...

Sentada na velha esplanada, de frente para o mar, sinto a voraz energia que dele emana... a mesma que flui através de mim e me envolve numa doce teia de deslumbre.
Inspiro. O cheiro salgado a algas entranha-se no meu corpo enquanto a leve brisa sacode os caracóis que me emolduram o rosto. Um ou outro fio castanho, mais atrevido, turva-me a vista enquanto te encaro. Descrevo-te o momento sem que me possa manter indiferente à tua presença. Fascinas-me. Inebrias-me com a sensualidade com que me brindas. Neste meu cantinho, que não passa de meio metro quadrado de paraíso, consinto-te a carícia! Surpreendes-te! Eu sei! Há quantos anos me recolhi nesta concha e me converti num bivalve racional?! Tantos que já não têm conto. E agora tu... só tu... recém reencontrado, consegues o milagre de me fazer sair das paredes que considero um confortável refúgio.
Tens razão em te admirar com o meu regresso... Quantas vezes nos teremos cruzado, no último ano e meio, que me tivesses assim... debaixo da tua mirada, exposta e feliz?! Uma, duas... não mais do que isso!
A força do teu olhar ilumina-me a alma e fazes com que volte a ter consciência da essência feminina e humana que me abraça.
De repente, voltaste a ser o amante que não tenho, o companheiro que não desejo... De repente, fazes que com que sorria estarrecida com esta sensação de plena liberdade.
Olho as pessoas que na praia jogam, conversam, lêem ou dormitam. Ainda que não percebas porquê diverte-me fazê-lo. Sentes-te traído. Amuas e nem sequer consegues admitir que deveria ser eu a sentir-me assim.
Rabisco numa folha os teus traços e, silenciosamente, prometo-te que pelo menos durante alguns meses te farei companhia. Não mais do que isso... Não quero?! Não... Tu não o permitirás.
Apercebo-me que um casal de idosos me olha de forma estranha, sem compreender porque entre dois ou três suspiros o sorriso de pura felicidade se alarga. Também eles são apanhados desprevenidos pois não te vêem como eu! Provavelmente, pensaram que me assaltam pensamentos menos puros ou dirigidos a alguém menos especial.
Lês o que escrevo... sorris e acusas-me de gostar de jogos de palavras. Será?! Provavelmente terás razão. Mas gosto mais de ti, do teu calor e da tua presença.
Espero que me saibas perdoar a ausência de tantos meses. Perdoas?! Eu sei que sim!
Prometo-te que de agora em diante me verás mais vezes com excepção daqueles dias em que te esconderás atrás das nuvens sem que por um ínfimo espaço de tempo me permitas ver o ar da tua graça.
Juntos iremos partilhar muitas manhãs, outras tantas tardes e, inclusive, haverá dias em que, momentos antes de desapareceres no horizonte, te permitirei beijar-me a fronte... mais uma vez.
Por hoje, despeço-me de ti. Deixo-te na companhia das dezenas que invadiram a praia... e do mar que acaricias, ternamente, enquanto te lanço um último olhar!

Até breve, querido!

Matilde


A pequena folha de papel ainda está depositada sobre a mesa quando o seu vulto deixa de se avistar e se encaminha para lá das dunas...

Gonçalo senta-se, estende a mão... a mente regista cada uma das emoções enquanto um arrepio lhe percorre o corpo. Ao ler aquelas palavras, sente-se como se estivesse a invadir a privacidade de dois amantes. Quem as escreveu era uma incógnita indecifrável, no entanto comprazeu-o compor a imagem feminina da sua autora. Por momentos, imaginou que aquela missiva lhe era dedicada... e quase sentiu a doçura daquele terno olhar.

Como é bom sonhar!

terça-feira, maio 10, 2005

84. Enigma Continuação

O dia amanhecera solarengo e agradável mas no fim da tarde pequeninas nuvens surgiram no horizonte. O sino da igreja anunciava as dezanove horas quanto um leve aguaceiro a surpreendeu... Faltava uma hora para se encontrar com João.
Abalada pelos sucessivos e misteriosos telefonemas sentira-se pressionada a revelar-lhe a sua conduta pouco ou nada correcta. Não havia como fugir ao confronto.

Mil e um pensamentos invadiram a sua mente e todos a inquietavam ainda mais. Ele não iria perceber... nem aceitar mas a culpa era, exclusivamente, dela.

Três horas depois, Catarina, percebia que não se enganara. João não só não conseguiu compreender o que a levara a traí-lo como a acusara de ser egoísta, mesquinha, cínica e muito... muito pequenina. A discussão fora acalorada, a mágoa instalara-se e nenhum dos dois conseguiu encarar o outro. O relacionamento que mantinham há tantos anos terminara de forma brusca...

Os dias que se seguiram foram para ela os mais difíceis... tudo a entediava e, por uma ou duas vezes, cometera erros crassos no trabalho. Ao fim de uma semana admitiu finalmente que precisava de descansar e se afastar da rotina durante um par de dias.
A verdade é que nunca chegara a considerar a hipótese de vir a arrepender-se tão violentamente de tudo. Amava-o mais do que nunca...
Naquele Sábado o sol voltou a invadir cada recanto da cidade. Obrigou-se a sair de casa. Quando chegou à praia poucos eram os que por lá se aventuravam. Aquele lugar fora o palco de muitos dos momentos felizes que partilharam. O preferido dele... deles. Ali sentia-o tão próximo de si que se fechasse os olhos quase o poderia tocar.

Ao longe avistou dois vultos abraçados. Inexplicavelmente não conseguia afastar o olhar... Os contornos das suas silhuetas pareceram-lhe de tal forma familiares que ao conseguir distinguir-lhes os traços quase não se surpreendeu. João e Inês...

Agora percebia...

Catarina poderia até imaginar que compreendia mas, na verdade, nada sabia sobre o enredo que os amantes tinham engenhado.
Inês era uma bela mulher e João há muito que não lhe resistia... mas sendo o pai de Catarina o seu chefe não poderia simplesmente terminar o relacionamento e admitir o seu deslize... Era cobarde?! Sim! Ele sabia.
Juntos, ele e Inês, arquitectaram um plano por forma a abstraírem-se de qualquer suspeita e culpa.
Sabia que Carlos se apaixonara pela sua namorada e só não se aproximara dela por respeito... Bastara-lhe revelar ao amigo o seu romance para que este se insinuasse. A carência afectiva dela fizera o resto.
Naquela noite fora muito fácil esgueirar-se pela casa: Inês entretinha Catarina na cozinha, Joana tagarelava sem parar com Carlos e, ele, com o pretexto de ter de lavar as mãos acabou por ficar sozinho. Disfarçar a voz também tinha sido muito simples... sempre lhe disseram que imitava os outros muitíssimo bem. Viesse quem viesse ninguém poderia negar que tinha sido um óptimo actor.
Estava feliz?! Não tanto como tinha suposto...

sexta-feira, maio 06, 2005

83. Enigma Continuação

A esplanada estava quase vazia apesar do sol convidar a meia hora descontraída, no café do CCB. Catarina aproveitara o fim da tarde para espairecer. Fazia-lhe companhia o último livro de Dan Brown, "Anjos & Demónios". O título lembrava-lhe os últimos acontecimentos... aqueles que tinham povoado a sua vida de seres horrendos. Há duas semanas que era assim... desde o maldito jantar.
Quantas vezes se questionara...?! Quantas vezes se perdera em suposições e imaginou os mais mirabolantes enredos. Só sabia que Carlos e Joana não tinham sido os autores do delito.
Carlos, mediante a sua recusa em terminar a relação com João, confessara que aquele amor clandestino tinha perdido a magia. Na verdade desejava poder sair à luz do dia de mão dada e viver a vida a dois de forma plena. Esse não era o objectivo dela. Ele sabia... tal como lhe era inegável que chegara o momento de se afastarem.
Joana, por seu lado, que há muito ambicionava arranjar um trabalho melhor, surpreendera-a com a notícia de que fora seleccionada para gerir um dos departamentos da dependência espanhola. Catarina ignorava, por completo, que a amiga era licenciada em Gestão de Recursos Humanos. Ficou feliz por ela ao mesmo tempo que se sentiu invadida por um sentimento de culpa...
Restavam João e Inês... A dor da desconfiança consumiam-na e cada vez que o telemóvel tocava o pânico apoderava-se dela. Qual dos dois teria o diário?!

quarta-feira, maio 04, 2005

82. Enigma




Catarina contempla, da janela do seu quarto, o pôr-do-sol. Uma estranha nostalgia abate-se sobre ela enquanto se relembra dos últimos dias... Não compreende a insatisfação que a tem dominado.
Namora com João desde a adolescência mas há muito que a velha magia se esfumou. Talvez por isso tenha cedido à tentação e desfrute de forma tão intensa dos momentos que passa na companhia de Carlos. Na realidade, são eles que quebram a monotonia da sua vida. É urgente resolver o imbróglio dos seus sentimentos mas aquela situação afigura-se-lhe muito cómoda. Enfrentar a família e os amigos, terminar o namoro, é uma possibilidade que, para já, afasta.
A paixão terminara, acomodara-se! Mas quantos relacionamentos não sobrevivem à base de amizade?! Não fosse a desconfiança de Joana e tudo seria perfeito. Ás vezes surpreendia-se a duvidar da sua amizade. Carlos advertira-a, por mais do que uma vez, de que a posição que ocupava na empresa atraía muitas invejas e aproveitadores. Seria possível que Joana recorresse, de forma consciente, à amizade que as unia para obter regalias?!
Enfim!! De uma coisa estava certa... da sinceridade de João e da plena confiança que ele depositava nela. Se por um lado a enternecia saber disso por outro fazia com que se sentisse, ainda mais, culpada. Desabafara com Inês as suas preocupações e surpreendera-a a repreensão da amiga. Chamara-a de egoísta, fria, calculista. Era assim...?! Uma mulher demasiado convencida de si própria que conseguira sem esforço o que muitos não ousavam, sequer, almejar?! Ou seria que em Inês ainda existia o velho ressentimento de ter sido preterida por João?!
Abanou a cabeça como se procurasse afastar toda a insegurança e energia negativa que estava a tomar conta dela. Naquela noite iriam jantar juntos, ali em casa. O melhor que tinha a fazer era tomar um reconfortante banho, colocar o seu sorriso mais resplandecente e dar-se por feliz de ser quem era.

A música envolvia a atmosfera da sala, o jantar já se dera por terminado e a casa voltara a estar vazia. Por momentos, desejara que a noite se alongasse... Pela primeira vez em muitos meses, voltara a olhar para o namorado com adoração. Tinha sentido a frustração a tolher-lhe os sentidos quando, também ele, saíra sorrateiramente como se em casa o aguardasse algo mais emocionante que os seus murmúrios, habitualmente, desprovidos de emoção. A solidão da calada da noite atingiu-a com a ferocidade de um murro no estômago vazio.
Meia hora depois de terem saído recebera o primeiro telefonema...

- Eu sei de tudo... – a voz soara-lhe abafada e metálica.

Um calafrio percorreu-lhe a coluna quando o pensamento ganhou forma. A desconfiança minou-lhe a parca segurança e trémula dirigiu-se ao quarto. Abriu a gaveta adivinhando-a vazia... o diário desaparecera. Cinco pessoas estiveram naquela casa desde a última vez que ali o deixara. Se não tinha sido ela a dar-lhe sumiço restavam-lhe quatro hipóteses... João... Inês... Carlos... e Joana.
A dúvida instalou-se.

- Eu sei de tudo... como consegues?! – novo telefonema... a mesma voz.
- ...de tudo?! De tudo o quê?! – respondera-lhe aparentando uma calma que não sentia.
- De tudo! Como consegues?! – replicaram do outro lado.
- Não há nada para saber...
- Não?! Tens a certeza?! Tens tido noites muito animadas... tórridas, diria!
- Vai à... – gritou-lhe enquanto a chamada foi subitamente interrompida.

O que significava tudo aquilo?!

Recordou-se de João, da forma inesperada como alterara os planos e lhe dissera que não ficaria com ela aquela noite; de Carlos que um dia antes lhe pedira para ser frontal com o amigo e terminar a relação... e Inês, não a censurara?! Não lhe dissera que estava a ser vulgar, imoral e não merecia a pessoa que tinha do seu lado?! Restava Joana... a fútil colega de trabalho, a quem interessavam apenas belos penteados e trapinhos de última moda. A mesma... que naquela tarde lhe “exigira” que a promovesse a sua secretária. Claro, em nome da amizade que as unia.
Qual deles traíra a sua confiança e invadira o espaço intimo do seu quarto para lhe roubar o pequeno caderno... onde depositava os seus mais secretos devaneios?!

domingo, maio 01, 2005

81. Dia da Mãe



Acabei de falar contigo e não resisti a escrever-te uma dúzia de palavras. Porquê?! Porque se impõe que te diga novamente o quanto te amo.

Estou sentada na esplanada junto a casa... Fecho os olhos e abstraio-me de tudo quanto me envolve. Até do rio, dos pássaros, das crianças... de tudo! Recordo tantas coisas, mãe... A suavidade dos teus traços, o calor da tua voz carregada de alegria, o eco dos teus pensamentos ou o carinho que brota do teu coração...
Recuo no tempo, volto a ser pequenina e neste meu devaneio procuro novamente o aconchego do teu regaço. Separam-nos quilómetros, aproxima-nos o amor e a sensação de que a tua cálida mão está sempre aqui, a afagar-me carinhosamente o rosto.
Sabes...?! Sinto-me uma privilegiada por te ter como mãe e por me teres permitido crescer num ninho equilibrado, protegido da infelicidade que se abate sobre muitos lares. É verdade que nem sempre concordei contigo, nem sempre compreendi as tuas advertências... vezes houve que não as acatei mas, ainda assim, nunca duvidei do que te movia.
Há quem estranhe esta adoração que te dedico, a ti e ao pai... Há quem pense que não cresci e continuo a mesma menina de outrora... aquela a que acusavas ternamente de ser “melada”. Como poderia eu sentir-me diferente se sempre foram os meus melhores amigos?! Os eternos ídolos... os heróis de toda uma vida?! Por mais que diga ou que escreva ficará sempre algo por confessar. Sempre foste mais que a mulher que me deu à luz, mais que uma figura materna....
Tento encontrar as palavras certas para te dizer o que me vai na mente e no coração. Não as encontro. Talvez não existam. Ainda que seja insuficiente dizer-te que és a melhor mãe que alguém poderia desejar é isso que te digo... Terna, atenta, carinhosa, dedicada, presente, amiga...

Adoro-te! Muito, mãe!
Obrigada por tudo...

quinta-feira, abril 28, 2005

80. BookCrossing



Uma... duas... três semanas passaram desde que João encontrou o livro no anfiteatro da Gulbenkian. Engenheiro electrotécnico de profissão, não o entusiasmam livros que não os técnicos mas sente, há muitos anos, um especial fascínio por Da Vinci. Talvez por isso tenha, no final daquela tarde, folheado as páginas do famoso exemplar com alguma expectativa. Incapaz de interromper a leitura redescobriu o prazer de ler... Os seus olhos percorreram cada frase, com incontestável interesse pelo enredo que se revelara, inesperadamente, apaixonante.
Nos dias que se seguiram, muitos foram os amigos que o ouviram falar daquele aglomerado de folhas amarelecidas que de forma inusitada chegara até si.
Joana é membro de um grupo de leitura que engloba pessoas de várias nacionalidades e quando o ouviu relatar o episódio não se conteve:

- Provavelmente alguém se esqueceu dele...

- Não acredito... Eu tinha comprado o jornal e resolvi sentar-me no anfiteatro. Àquela hora não havia quase ninguém por lá. Bem vi quando uma rapariga o deixou num dos bancos. Estranhei. Quando me fui embora passei junto ao local onde o tinha colocado... Li o título e como estava abandonado trouxe-o comigo. – retorquiu ele.

- A Gulbenkian é um dos locais onde habitualmente abandonamos livros... Não reparaste se tem um símbolo com um livrito com asas?

- Não... por acaso não. Nem me tinha recordado desse disparate que vocês têm de deixar assim os livros. Com os preços que têm...

- Não é um disparate, João...

Ficou intrigado. Mal entrou em casa propôs-se a desvendar o “mistério” e qual não foi o seu espanto quando se deparou com o pequeno logotipo do Bookcrossing.
Este foi o primeiro contacto que teve com o movimento que no nosso país tem vindo a ganhar cada vez mais adeptos.
Os livros são caros, é verdade. Perder um assemelha-se a ficar-se espoliado de um tesouro mas emprestá-lo é permitir a outrem descobrir a magia que poderá abarcar na sua singela existência. Esta foi a constatação que levou João a inscrever-se como membro desta grande família de leitores. Hoje, tem duas dezenas de livros a circular por Portugal ou quiçá até pela Europa. Certo é que, partilhar estes bens que tem como preciosos, o satisfaz de forma muito positiva. Já ninguém se admira quando, entre um e outro café, lança o tema sobre a mesa e tenta motivar os restantes para a iniciativa. Fui apanhada nesta sua trama... e como ele não perco a oportunidade de a divulgar...
“O Bookcrossing é um clube de livros global, que atravessa o tempo e o espaço. É um grupo de leitura que não conhece limites geográficos. Os seus membros gostam tanto de livros que não se importam de se separar deles, libertando-os, para que possam ser encontrados por outros.
O objectivo do Bookcrossing é transformar o mundo inteiro numa biblioteca.”

sexta-feira, abril 22, 2005

79. Fim-de-semana prolongado...

A noite já deixou de ser uma menina quando por fim se escrevem as primeiras palavras. A escassas horas de entrar novamente no comboio, e vencer a distância que me separa daqueles que mais amo, vou enumerando mentalmente os companheiros de viagem: um caderno, um livro, uma caneta, a máquina fotográfica...
Sorrio.
Gosto de sorrir tal como gosto de escrever... e sempre que um motivo pertinente surge não deixo passar a oportunidade. Assim sendo, a boa disposição impera no curso dos meus dias, e a escrita também. Desta vez o mote foi o lembrar dos mimos que me aguardam... Um fim-de-semana prolongado até terça-feira que vai permitir “matar” saudades, não só de terras beirãs como também de familiares e amigos. Abandonado à sua sorte fica este meu cantinho. Por isso, resta deixar meia-dúzia de palavras a quem por aqui passar, a promessa de regressar em breve e votos de um excelente fim-de-semana.

Bom fim-de-semana.

quinta-feira, abril 21, 2005

78. O livro de cabeceira



Solto os dedos sob o dicionário e com um olhar enlevado admiro as páginas amarelecidas deste companheiro de viagem. Se me perguntassem qual era o meu livro de cabeceira seria este velho e pesado aglomerado de folhas que nomearia, para espanto de quem o ouvisse. Quantas vezes o abri ao acaso e me quedei perdida no tempo numa emocionante descoberta como quem percorre os trilhos desconhecidos de uma qualquer expedição. Ao contrário do que seria credível foi desta forma que apreendi o significado de palavras como hipocrisia, maledicência, xenofobia, ou ainda, júbilo, fleuma, ventura...
Hoje, muitas horas depois de ter escrito aquele conto que ficará durante algum tempo a fermentar antes de ser lido por mais alguém, vi-me a braços com um dilema: o que vou escrever?! Olhei a capa vermelha do meu amigo e sorri-lhe com a certeza de que ele me ajudaria. Foi assim que, de página em página, o texto foi surgindo e voltei a relembrar os irreverentes tempos de adolescente.
Nunca gostei de calão, dificilmente virei a gostar, mas aos quinze anos era frequente “escapar-me” o vulgar “porra”. Recorria a ele para manifestar o enfado e valeu-me a repreensão da, então, professora de português. A timidez daquela vez não me impediu de ripostar e de referir que “porra” não era calão. A definição que constava no dicionário referia que o termo era sinónimo de moca, porro, porrete... quanto muito, irra. Quando concluí, sentada na velha cadeira de madeira, encolhi-me envergonhada. Responder ao professor não era bonito nem de boa educação. Esperei de rosto vermelho nova censura mas, ao invés disso, fui brindada com um sorriso.
- Tens razão, Maria! Mas por vezes as palavras têm outros significados e, aquilo que pronunciamos sem maldade poderá ser interpretado incorrectamente. A decisão é tua... mas de futuro preferia que não voltasses a dizer isso.
- Sim, senhora professora... – respondi, agora sim timidamente.
O episódio ficou na memória e contribuiu, em muito, para que tenha normalmente cuidado com as palavras. O português pode, por vezes, ser muito traiçoeiro!

terça-feira, abril 19, 2005

77. Perigo: Colisão em 2034?


"Asteróide pode colidir com a Terra em 2034"
in Diário de Notícias, 19 de Abril de 2005

O dia 1 de Abril já lá vai e assim não fosse poderiam os leitores do Diário de Notícias imaginar que a este título se seguiam meia dúzia de palavras desfasadas da realidade. Poder-se-ía até supor que era, afinal, o produto imaginativo de um jornalista empenhado em se dedicar à ficção científica. Talvez até fosse um simples fã do filme "Armageddon", em que Bruce Willis e uma equipa de perfuradores de petróleo, na qual depositava a sua maior confiança apesar de se nos afigurarem um “bando de lunáticos”, aterram num asteróide em rota de colisão com a Terra. Mas na verdade, hoje dia 19 de Abril, foi este um dos temas abordados na edição do referido jornal, relatando-nos o que ontem, no britânico The Times, foi noticiado.
O asteróide em causa, baptizado com o nome de “2004 MN4”, vai em 2029 e 2034 “andar” demasiado perto da Terra. Ainda que nos seja revelado que, este corpo celeste, “não tem dimensão suficiente para pôr em causa a sobrevivência do planeta e dos seus habitantes”, não se pode ignorar que poderá “atingir a Terra com o impacto de uma explosão de 1000 megatoneladas, espalhando a destruição numa escala regional, na área do seu embate.”
No passado fim-de-semana, o canal AXN transmitiu o filme anteriormente indicado. Resta desejar que os cientistas possam detectar a tempo o perigo e equacionar uma solução, por mais extravagante que possa parecer como o foi em “Armageddon”.

domingo, abril 17, 2005

76. "Fiel ou Infiel" TVI



Ser fiel ou infiel é um tema que tem sido muito abordado. Há pouco mais de um mês foi divulgado na revista "FOCUS" (N.º 282, semana de 9 a 15 de Março) que a infidelidade tem causas genéticas e que quando a mulher procura parceiros extraconjugais pretende, desta forma, garantir os melhores genes aos seus descendentes.
Sabe-se que a infidelidade sempre existiu, que não é um problema do século XXI, mas o facto é que cada vez mais se constata o número acentuado de casos que se têm vindo a manifestar na nossa sociedade.
Da leitura atenta do texto publicado na referida edição fica a ideia de que a fidelidade é “anti-natura”. Será isto possível?! Para os mais conservadores certamente que não.
Onde se começa a ser infiel?! Quando se contempla alguém e o pensamento discorre de forma pouco abonatória para quem tem um relacionamento “estável” ou quando se dá aquele passo que leva à sua concretização física?! Para uns a traição tem início com o primeiro devaneio, para outros com o primeiro beijo, ou como alguns defendem quando o envolvimento se transforma em sexual.
Um investigador britânico do Hospital St. Thomas denúncia: 20% das crianças de dois bairros ingleses são fruto de relacionamentos extraconjugais, não sendo filhos dos supostos pais. Os dados apresentados são chocantes e levam à pergunta: Como seriam os obtidos se em Portugal se levasse a cabo semelhante estudo. Seriam idênticos, inferiores ou superiores?! Fica a dúvida.

“A traição é um acto de egoísmo. Na altura, pesamos os prós e os contras. E se vamos em frente é porque não gostamos da pessoa que está ao nosso lado.” Assim o disse alguém que já traiu. Mas se não se ama porquê manter uma relação?!

As perguntas vão surgindo enquanto poucas respostas se vão encontrando.

“Fiel ou Infiel” é um novo programa da TVI, emitido á sexta-feira. A ideia original vem do Brasil pela mão do apresentador João Kleber, filho de pais portugueses, oriundos da região norte do país e emigrados há algumas décadas naquele país.
A polémica instalou-se. Acusações são feitas e apreciações surgem nos media. O certo é que não se sabe o que é mais deprimente... se o formato do programa, com péssimos actores, se recordar a elevada percentagem de casos de infidelidade em Portugal ou o facto de haver pessoas, ditas inteligentes, que expõem a sua vida privada daquela forma.
Neste programa da TVI, como já é um hábito deste canal televisivo, explora-se ao mais baixo nível a condição humana sem qualquer tipo de respeito. Um respeito que devia começar nas próprias pessoas que se propõem a participar no teste.
Ser ou não infiel, ser ou não traído... é tudo uma questão de respeito, diálogo e carácter. Ou se tem ou não! Causas genéticas?! Não será antes a perda de valores, o stress, o egoísmo e uma acentuada leviandade no tratamento do mais íntimo dos sentimentos?!
Prefere-se pensar que este programa é mais um reflexo medíocre da deficiente personalidade que alguns (poucos, pelo menos assim se espera!) têm!

sábado, abril 16, 2005

75. Inspiração



Fecho os olhos, inspiro o ar
E da brisa do mar fica-me a recordação
De tardes perdidas no curso dos dias...
Dos meus... dos teus... dos nossos!
Os anos que não me pesam, passam...
Trazem-me, mais que tristezas, alegrias
E do ontem recupero apenas o necessário,
O suficiente, o imprescindível,
Para não me esquecer...
Do que fui e do que sou!

Fecho os olhos, inspiro o ar...
Sinto o peito estremecer,
Numa tal comoção que por instantes...
Sinto-me desfalecer.
Amanhece ou anoitece.
Nasce-se ou morre-se.
Vive-se, sabendo que o amanhã...
Será mais um dia de esperança!

Fecho os olhos, inspiro o ar...
De mim para mim digo... sei-o!
Vivo um sonho!
O de ser eu própria a cada despertar,
Sem máscaras nem mentiras...
Assim... e assim... Enfim! Eu!

quinta-feira, abril 14, 2005

74. Crise...



O olhar queda-se imóvel sobre a encruzilhada de letras e linhas impressas no jornal, enquanto no seu íntimo a revolta ganha forma. Suspira e quase desiste de fixar os insolentes anúncios de emprego.
Há meses que abre o jornal expectante mas nada de novo é publicado naquelas cinzentas páginas. Ordenados base, altos lucros, condições aliciantes e possibilidade de carreira... a esses mal presta atenção. Para quê se são palavras escolhidas a dedo para esconder degradantes situações de trabalho precário?!
Afasta por fim os olhos esverdeados do papel salpicado de caracteres e observa os rostos sisudos dos que a rodeiam. Um casal discute baixinho... um senhor, de idade avançada, debruça-se sobre um livro de páginas amarelecidas e, mais além, dois jovens desabafam sobre a incompetência deste, a inércia daquele... Inês encolhe-se no desconforto da cadeira de madeira e, abstraindo-se da realidade dos dias que correm, imagina-se a trabalhar no departamento de formação de uma qualquer empresa. Ali fica, envolvida em sonhos, um quarto de hora quando sobressaltada se apercebe que lhe perguntam as horas. O interpelador era o leitor compenetrado daquele livro que já vira melhores dias...
13:50... Quase sem se aperceber o tempo passara. Tinha que regressar ao trabalho... sem a esperança de melhores dias!
Inês é uma, entre muitas, das pessoas que neste país se debatem com a insatisfação profissional, sem conseguir antever um rasgo de luz. Não fosse o reconfortante carinho de amigos e familiares a sua vida seria simplesmente frustrante. Assim... é no amor, na amizade, na verdade e na lealdade que encontra o mote dos seus dias! Talvez por isso se considere afortunada...
Diz-se que o país está em crise económica... mas a ela parece-lhe que a crise vai além disso. Foi acompanhada por este pensamento que alcançou a porta do prédio onde trabalha... e bem a tempo de ver o Dr. Carlos afastar o olhar de uma criança, suja e esfomeada, que se lhe dirigiu.
No seu silêncio descontente insurgiu-se perante semelhante atitude. Sem coragem de subir as escadas e, também ela, ignorar o tímido pedido da menina perguntou-lhe:
- Tens fome?
- Tenho... hoje só comi uma sopa que o senhor do “Tacho” me deu.
Entraram as duas no café que ficava ali mesmo ao lado. Era cliente habitual daquele pequenino estabelecimento e o Sr. João quando a viu sorriu...
- Não diga mais nada... que eu já sei o que me vai pedir.
- Obrigada, Sr. João. Eu ás seis pago-lhe.
- Vá descansada.
Um sorriso espontâneo abeirou-se dos seus lábios enquanto subiu apressadamente as escadas. Estava atrasada cinco minutos mas feliz...
A crise económica não explica a frigidez do coração nem o latente egoísmo de algumas, demasiadas, pessoas!

sábado, abril 09, 2005

73. "Só o amor é real"
Brian L. Weiss



A “primeira” vez que te vi foi no aeroporto de Lisboa. Faltavam trinta minutos para embarcar, rumo a um destino onde poderia finalmente descansar, e esquecer o projecto fracassado devido à incompetência do gestor de marketing.
Trazias contigo um pequeno volume, embrulhado num bonito papel com sorridentes ursinhos. A forma cuidadosa com que o seguravas enternecer-me. Na altura, recordo-me, imaginei-te no papel de pai. Inconscientemente, soube que serias, um daqueles, atento, amigo, carinhoso, paciente... dedicado! Simpatizei contigo.
Demasiado embrenhada nestas deambulações mentais não me apercebi que a diminuta carteira que trazia comigo escorregara colo para o chão. Recolheste-a. Encontrei o teu olhar e senti-me como se tivesse sofrido uma descarga eléctrica. Agradeci. Procurei sem querer uma aliança na tua mão esquerda, que não encontrei. Sorri e observei-te a caminhar em direcção ás portas de embarque.
Pensava que “nunca mais” te veria mas isso não me incomodava. Talvez soubesse que numa outra vida nos acabaríamos por encontrar. Não foi preciso esperar tanto. Quis o destino que o nosso avião fosse o mesmo e determinou a sorte que o teu lugar fosse junto ao meu. Foi deste modo que me foi possível saber que ias visitar a tua irmã. O Gonçalo tinha nascido há uma semana.
Como qualquer tio “babado” não resistiras a pedir alguns dias de férias. Confessaste-me que te pesava a consciência porque deixaras a meio um qualquer relatório.
A ansiedade dominava o teu espírito. Em breve irias conhecer o teu primeiro sobrinho. Ficarias “uma semana” em Nice. Eu também. Eu regressaria no Domingo e tu no Sábado. Não trocámos números de telefone e nada previa que nos voltássemos a cruzar. Qual não foi o meu espanto quando te vi, naquele Domingo, junto à zona de “check-in”. Tinhas adiado a tua viagem de regresso um dia e timidamente confessaste que tinha sido por mim.
O contacto manteve-se. Uma sólida amizade nasceu e quando nenhum dos dois conseguia já negar o inegável... dez meses depois da viagem a terras francófonas, pediste-me para casar contigo. Aceitei.
Hoje, doze anos depois, quatro desde que percebi a razão daquela intrigante sensação de sempre te ter conhecido, voltei a ler o livro que me permitiu compreender. “Só o amor é real”, escrito por Brian L. Weiss, recordas-te?! Não teria sido necessário lê-lo para saber que sempre estivemos destinados a partilhar a vida mas ajudou-me a decifrar o elo inquebrável que nos une.
Ás vezes, perguntas-me se sou feliz. Muito, respondo. Tanto que não existem palavras que possam descrever a dimensão desta felicidade.
Sabes... mais do que na vida, acredito no poder do amor e nos desígnios do destino.
Creio que nunca te disse, mas antes de te conhecer inúmeras vezes me questionava como seria amar alguém ou encontrar aquela que seria a minha alma gémea. Sentia-me como se estivesse, pacientemente, à espera... Conscientemente, não sabia do quê ou de quem. No entanto, algures nas entranhas do meu ser sei que era por ti que aguardava... O complemento mágico da minha essência estava em ti.
Porque te escrevo esta carta, querido?! Porque por mais que te repita que te amo nunca serão as vezes suficientes para retratar o amor que te tenho!

Amo-te! Hoje mais do que ontem... menos do que amanhã!

Com amor,

Ana


Ana tem hoje 44 anos, mais de metade da sua vida dedicou-a a estudar e trabalhar. Até conhecer João não tinha outra motivação que não fosse ter uma confortável estabilidade económica. Os dias eram incrivelmente vazios e desprovidos de emoção. Aos 31 anos apaixonou-se por ele, quatro anos mais velho e tão “workaholic” como ela. Juntos descobriram a magia e o poder do amor, delinearam um novo projecto de vida e descobriram que é possível ser-se, verdadeiramente, feliz.
O que é verdade?! O que é mentira!? Só o amor que os une é real!
Têm um filho de oito anos. Um menino a quem se dedicam com um amor infinito. Idealizam e concretizam cada dia como se fosse parte integrante de um sonho... e têm no livro de Brian L. Weiss a “prova” de que os seus passos estão eternamente unidos.
Ana e João ousaram ouvir a voz do coração!