segunda-feira, fevereiro 28, 2005

54. Política versus Hipocrisia



Não gosto de política. Muito menos de hipocrisia. Lamentavelmente, inúmeras vezes verificamos que uma é sinónimo da outra.
Quantas vezes abanamos, desoladamente, a cabeça num gesto de desaprovação perante esta ou aquela imagem que nos chega pela televisão... ou ante as notícias de um qualquer jornal?!

A uns, poderá parecer um atentado as palavras que me proponho, finalmente, a escrever. A outros nem tanto, mas não pude manter a, usual e aparente, indiferença quando passeei os olhos pela primeira página do Diário de Notícias: Santana deixa em aberto candidatura presidencial!
Surge a pergunta: Não terá sido a derrota, do passado dia 20 de Fevereiro, suficiente para demonstrar ao Sr. Lopes e aos santanistas qual é a opinião generalizada da população portuguesa?!

Da sua passagem pela Figueira da Foz fica a noção de ter contribuído para desenvolver o município, quer a nível económico-social como cultural. Em contrapartida, a sua actuação como presidente da Câmara Municipal de Lisboa valeu-lhe o erguer em riste dos dedos, não só da classe política como também, da população alfacinha.
Se nos referirmos à sua transição para o governo fica a imagem de uma ascensão imposta, que poderá incorrer na violação dos princípios, mais básicos, da democracia.

Depositou o seu voto numa das urnas eleitorais, aquando da saída de Durão Barroso? Elegeu este Primeiro-Ministro?
Eu... também não!

O desenrolar dos acontecimentos nacionais desde, 17 de Julho 2004, a data em que o XVI Governo Constitucional tomou posse, veio a confirmar os receios, tantas vezes, denunciados.
O descontentamento foi geral e o desgoverno uma realidade demasiado evidente para ser ignorada.

Bom vivant, marcado por uma personalidade que não prima pela força. Detentor de uma frágil visão analítica, desfasada das actuais necessidades do país, não só se mostrou insensato nas medidas propostas, como ainda denunciou que de coerência só tinha a suficiente para encaminhar Portugal para uma trajectória propícia ao completar de um total despiste da economia, das questões sociais e da cultura.

Em face de tudo isto, mais cego será aquele que não quer ver quais serão os resultados das presidenciais caso este Senhor... Senhor da boa noite lisboeta e das santanetes, se (atrever) a candidatar a Presidente da República.

Falta-lhe a visão apurada de Sá Carneiro, a coerência de Marcelo Rebelo de Sousa, até o empenhamento e determinação económica de Cavaco Silva. Diria até mais, nomeando personalidades de diferentes cores políticas. Carece da inteligência de Álvaro Cunhal e até da arrogância inata que, muitas vezes, tenho detectado em Sócrates.

Com que argumentos poderá, Santana Lopes, contestar a sua morte política que não sejam objectos delatores de uma hipocrisia sem fim?!
Com que credibilidade poderá, também, retomar a Presidência da Câmara Municipal de Lisboa, se assim o decidir?!

Muitos erros terão sido cometidos no governo de Guterres ou de Durão Barroso mas, certamente, não tantos como os encabeçados por aquele que passará o testemunho a Sócrates, no início de Março.

Alberto João Jardim chamou Sr Silva a um dos homens deste país que se poderá orgulhar de ser, mais que um político, um ser humano que faz valer a sua opinião. Eu... a este político sem política, que não seja a de botequim e se fosse Camilo Castelo Branco, não o apelidaria se não de botiqueiro.

Nesta altura, muito pouco haverá que possa acrescentar... ou talvez houvesse, se gostasse de política. Mas não gosto! Abomino-a como se tratasse de uma maleita do pior que há. Até o é! Ou não lidasse, todos os dias, com a dura realidade de impostos excessivos, trabalho precário, deficiente serviço de saúde, ensino à beira de um colapso... Puras consequências dela!

Incontestável será dizer que impera, neste pequeno pedaço de terra lusa, a necessidade urgente de se ser comandado, mais do que por um político, por um líder determinado e equilibrado.

Será Sócrates esse líder?!
A ver vamos...

Quem será o Senhor que se segue a Sampaio?!
A ver vamos... mas dúvidas não existem que Santana Lopes não será!

domingo, fevereiro 27, 2005

53. Apontamento...



Café com Letras. A imaginação expande-se no aconchego de um dos inúmeros recantos de Cacilhas. O mote?! Artes! De que se fala?! Paula Rêgo, Orfheu, Émile Zola...

Sinto-me em casa! Numa casa que é a de muitos mas que, também, é a minha num ínfimo segundo da contagem dos dias...

O cheiro a café entranha-se no ambiente, funde-se com o do fumo dos cigarros, esquecidos nos pequenos cinzeiros, e neste princípio de noite, fim de dia, o tempo é de partilha, amizade, cumplicidade e evolução.

Os livros prostrados sobre as prateleiras, cartazes a anunciar lançamentos de livros, iniciativas culturais, ou simples desenhos infantis a adornarem as paredes... devolvem-me a sensação, aconchegante, de outros espaços onde também as conversas fluíram e confortavelmente se passeavam os olhos pelas páginas amareladas de um qualquer livro.

Impera a simplicidade do espaço e uma serenidade sem fim propícia ao mais puro divagar das mentes e do coração.

A companhia?! Dois queridos amigos, caminheiros de diferentes e iguais andanças como assim o determina o curso da sina afecta a cada um de nós.

O ténue zumbido da máquina de café ecoa pelo espaço enquanto volto a inspirar o aroma da bebida estimulante que me é servida com letras... Café com Letras!

A conversa prossegue enquanto, no silêncio dos meus pensamentos, sou brindada com a certeza de que são momentos como este que, mais tarde, se hão-de recordar...

Apontamento:

A recordar... num futuro próximo:
Instantes partilhados com amizade!


Café com Letras


Rua Cândido dos Reis, n.º 88 a 94
Cacilhas
2800-269 Almada
Telefone: 212761601

sábado, fevereiro 26, 2005

52. "Desgostos fazem mal ao coração"
Sábado



Desgostos fazem mal ao coração assim é anunciado, na edição desta semana da Sábado, entreabrindo a porta ao tema, inicialmente, abordado no New England Journal of Medecine.

Os desgostos de amor, a perda de familiares queridos e outros choques emocionais (um ataque de fúria por exemplo) podem desencadear sintomas semelhantes aos de um ataque cardíaco.

Fala-se do Síndroma de Coração Partido como é designado pela equipa da Universidade de Johns Hopkins, responsável pela pesquisa. A notícia, que agora nos chega, elucida-nos sobre o tema demonstrando-nos como a libertação acentuada de hormonas como a adrenalina e a noradrenalina, responsáveis pelo vulgarmente intitulado stress, reduzem o fluxo de sangue para o coração. Os sintomas denunciados são falta de ar, dores no peito ou batimentos cardíacos irregulares. No entanto ao contrário do enfarte este síndroma é passível de não deixar sequelas.
O mais cépticos poderão não acreditar mas, certo é que, fica desta forma confirmado que o coração, mais que o motor central do nosso corpo é também a morada de todos os sentimentos.

Lendárias histórias de amor são referidas como exemplo, verídico, das inerentes alterações que o síndroma, recém descoberto, provoca na vida dos seres humanos.
Quem não recordará este ou aquele enredo em que por um qualquer desgosto de amor alguém se entregar à depressão e ao isolamento.
Maria Callas, é sem dúvida um deles, muito bem retractado no filme Callas Forever, com Fanny Ardant e Jeremy Irons sob a direcção de Franco Zeffirelli.
Outro exemplo, que nos chega, mais que de boca em boca ou através dos livros de história, é aquele que María Pilar Queralt del Hierro nos relata no livro Inês de Castro.
O amor adúltero de D. Pedro levou-o a constatar o sabor amargo do desgosto e a ver os seus dias moldados pelo sofrimento de perder a sua amada. Da Quinta das Lágrimas ficou a lembrança dos momentos mais felizes e de D. Afonso IV a imagem da mão infame que ousou ordenar a execução daquela que viria, anos mais tarde, a ser aclamada Rainha de Portugal.

Duvidar para quê?! Exemplos serão desnecessários se num momento de reflexão se recuar até este ou aquele momento das nossas vidas... O coração bate sem compasso, apertado no peito enquanto a angústia parece não caber dentro de nós... A tristeza envolve os sentidos e o mundo parece desabar. Quem não sentiu já isto?!

quarta-feira, fevereiro 23, 2005

51. Gaivota Branca... de amor e verdade!



Num raro rasgo de lucidez, Atílio, contempla o doce deslizar do Tejo. Recorda longínquos tempos em que, realmente, estivera vivo. Sorri. O compasso de outrora devolve-lhe a nocção exacta de estar suspenso entre dois mundos, sem que fizesse parte de nenhum, e ainda assim, era feliz. Sabia-o!

É da janela do quarto, onde o quiseram encarcerar aqueles que duvidam da imortalidade do espírito, que o assaltam as lembranças. Os risos eram então risos, os abraços... abraços e o amor tão real como a fome que começava a fazer com que o seu estômago se contraísse.

Dali a instantes soariam as 13 horas, entoadas por algum velho sino de igrejas das redondezas. As mesmas que, tantas vezes, visitara com Joana, aquela que o aguardava para lá das nuvens que se avistavam ao longe, na linha do horizonte... e que, de uma outra dimensão onde pouco interessava a carcaça que servia de abrigo à alma, vigiava cada um dos seus curtos passos.

Há dois anos que partira. Pelo menos, assim lhe repetiam sucessivamente! Como se ele não se recordasse da visão do caixão a descer ás entranhas obscuras da terra! O que eles não sabiam, era que só a matéria jazia algures, num cemitério. A alma, essa, elevara-se e visitava-o, de tempos a tempos, sob o disfarce de um corpo frágil de gaivota, imaculadamente branca.

Nesses dias quedava-se ali, de braços no parapeito a falar-lhe baixinho. Afagava-lhe as penas sedosas e confessava-lhe que, afinal, a espera se revelava longa... Não estava cansado de viver mas sim de a não ter do seu lado... ao adormecer, ao despertar, a cada uma das longas horas que ia contabilizando!

Mais forte que tudo, que a própria vida ou a tenebrosa morte, o sentimento imperava! Tinha sido assim aos vinte anos, quando partilharam o primeiro olhar, e era assim aos setenta, quando ansiavam que as suas sinas se reunissem novamente... e os fundisse numa só alma de amor e verdade!

terça-feira, fevereiro 22, 2005

50. Feira do Livro em Fim de Edição
Gare do Oriente



A noite mal dormida não quebrou o compasso do dia. Nem me impediu de deslizar os olhos pelas lombadas dos livros, aos quais acariciava com a ponta dos dedos. Nem de, seduzida pela antevisão de umas dezenas de horas dedicadas à leitura, carregar o peso não de um... ou dois... nem de três, mas de cinco livros recém adquiridos na Feira de Livros em Fim de Edição descoberta por mero acaso.

A Feira do Livro em Fim de Edição apresenta publicações de mais de 50 editoras e estará aberta ao público até ao dia 13 de Março na Gare do Oriente, em Lisboa.
Os livros expostos são comercializados a preços convidativos tonando-se, até meados do próximo mês, num local obrigatório de passagem para os amantes da leitura. Fica a sugestão, de quem por lá já passou.

domingo, fevereiro 20, 2005

49. Poesia de ontem e de hoje.


Almada Negreiros

A corrente inquebrável que nos une
Torna o meu sorriso mais brando
E o meu olhar mais sereno...
Enquanto no aconchego das paredes,
A que chamo minhas,
Vou apelando a uma doce reforma...
Dos hábitos... dos desejos... da ventura!
Há dias... e à insensibilidade da maledicência imune,
Recuperei das horas mortas
O sonho ido!
Por momentos... a infância retornou,
Volveu o agridoce sabor da aventura,
E através de ti, recuperei a esperança!
Nada se perde, tudo se transforma!
Das cinzas do lume extinto,
Renasce a emoção que outrora me abandonou.
Falo-te de verdades de outros tempos,
Sentimentos errantes, que há muito não sinto,
Mas que sei tão reais como este momento!
Não será somente desejo...
Muito menos paixão...
É, afinal... o amor à vida, que retorna!

(escrito a 14 de Junho de 2004)

sábado, fevereiro 19, 2005

48. Adivinhe!

Os gritinhos do Guilherme ouvem-se por toda a casa.
Sentada, em frente do computador, preparo-me para delinear novos enredos, novas opiniões. Hoje, ao contrário do que é habitual, não me consigo concentrar. Da sala chega-me o som dos balbucios do meu sobrinho. Desisto! A euforia de o ter aqui é tanta, que se torna impossível obrigar-me a contemplar a insipidez do écran. O Word aberto e meia dúzia de ideias soltas não são suficientes para me abstrair do pequenino, que gatinha pela casa enquanto a minha mãe lhe vai dizendo:
- Vai, querido... vai ver o que a tia está a fazer.
Resta-me o tempo suficiente para desejar a todos um bom fim de semana...

Como despedida deixo uma adivinha...

Eu abro do amor as portas,
da vida as portas encerro,
Permaneço em coisas tortas,
mas não em monte ou desterro.
Adivinhe!


Uma dica?! Está relacionada com a escrita... naturalmente!
Qual será a resposta?

sexta-feira, fevereiro 18, 2005

47. Emoções!

O sol vai invadindo os recantos, da superfície terrestre, enquanto o comboio desliza sobre os carris.

O jornal ficou por comprar, as notícias por ler… O início da manhã foi caracterizado por uma invulgar azáfama. Dali a horas, 9 ou talvez 10, os seus progenitores entrarão pela porta. Invadirão, docemente, o pequeno espaço do T1 e sentirá, novamente, aquela alegria pueril envolver-lhe cada poro, cada célula, cada ínfima parte do meu corpo.

Este fim de semana descuidará a habitual rotina, prescindirá daqueles momentos que tanto preza, mas será recompensada, pelo carinho e amor recebido a cada instante.
Esquecida será a instabilidade do país, a hipocrisia da campanha eleitoral, o trabalho precário. Não haverão livros a ler, textos a escrever, notícias a devorar… caminhadas a realizar ou cafés solitários a tomar, enquanto se contempla a beleza mágica do Tejo, no fim da tarde.

Haverão, sim, instantes em que prevalecerá o amor, os risos, o aconchego de ter as pessoas que mais ama junto a si! Até a memória esbatida de um ou outro momento, em que o seu coração bate descompassado, será suplantada pela felicidade de poder encarnar esse seu lado, sensível e puro, de filha "babada", aplicada dona de casa, exímia cozinheira…

Há noite, mais que o eco da sua voz, serão os timbres suaves do pai e da mãe que se ouvirão e ao adormecer saberá que é feliz…

Ana em nenhum destes momentos sentirá a ausência de Filipe, para quem os dias há muito deixaram de despontar.

Ao contrário do que se possa pensar, não se refere a memória nostálgica de uma triste história.

Durante anos contaram com o apoio, incondicionável, um do outro. Viveram, intensamente, o amor que os consumia, numa plenitude tal que quando a morte os separou nenhum adeus havia a sussurrar. O silêncio sepulcral foi, tão somente, quebrado pelo murmúrio, abafado e grave, doce e profundo, sensível e mágico das suas vozes: Até breve…

Tão breve como o é… a vida!

terça-feira, fevereiro 15, 2005

46. Permitam-me duvidar!



É sentada no café, a meio do dia, que rabisco estas palavras.

Permitam-me duvidar da justiça portuguesa!
Permitam-me duvidar das notícias que leio, dos julgamentos que se fazem, mas também me permitam duvidar da inocência dos que a alegam!
Contra-senso?! Talvez!

Durante anos admirei-lhe o timbre da voz, o sorriso carismático com que nos brindava e o senso de humor com que ia entrando pelas nossas casas! Não falo de Herman José... a esse nunca tive em grande conta! Que me perdoem os seus fãs! E, até, ele próprio! É a outro que me refiro, a quem os enredos da vida perturbaram o que se suponha uma equilibrada caminhada.

Acreditamos no que queremos acreditar ou se calhar nas meias verdades que nos vão sendo relatadas, certo é que... permitam-me duvidar!
Permitam-me, ainda, chocar perante crimes brutais como estes que agora se julgam! Permitam-me duvidar das investigações que se fazem e das conclusões que se tiram!

Não pretendo fazer destas singelas palavras um apelo para que se acredite na, suposta, inocência deste ex-senhor da televisão. Quero, apenas, crer que algures perdidos no tempo estão os episódios que poderão provar a sua inocência. Ou pelo menos ressuscitar a representação fiel do sucedido!
Os crimes de que é acusado são por demais atrozes. Os tenebrosos "factos" documentados afiguram-se excessivamente sórdidos para que aquele ser, que nos invadiu cordialmente as casas, durante anos, os ter praticado.

Diz o povo que "quem vê caras, não vê corações", relembrando-nos que "onde há fumo, há fogo" enquanto, uns e outros, vão murmurando "a justiça é cega"... Será?!

Quantos detinham informações fidedignas de toda a brutalidade cometida com as crianças e se calaram durante anos?! Quantos participaram activamente na violação dos direitos destes pequeninos seres?! Quantos se renderam ao estupro porque os cativavam os presentes recebidos?! Quanta verdade?! Quanta Mentira?! Alguma vez se apurarão os acontecimentos passados?!

Permitam-me duvidar... que seja um vil carrasco de inocentes seres!

Desde o início do processo Casa Pia aguardei novos dados, novas provas, novos testemunhos, numa busca constante da verdade, a mesma verdade que agora Carlos Cruz exige do tribunal.

"Exijo deste tribunal a verdade, a verdade da minha inocência, porque eu estou inocente."

Será que a obterá?! Será que a obteremos?!
Ou será tudo reflexo de mais uma trama cabalística, de uma sociedade dita justa, moderna e inteligente...

Aguardaremos, expectantes, o desenlace... ainda que de esperança já pouco reste!

segunda-feira, fevereiro 14, 2005

45. Celebrar o amor?!



Escrever não basta... divagar também não! O amor é algo a viver-se com intensidade mágica! Ocorrem-me mil palavras, mil estados de espírito.... outros tantos momentâneos delírios e, ainda assim, nada que se assemelhe a esse sentimento enaltecido por tantos... desprezado por muitos!
Neste dia, em que se promove a celebração desta emoção, que não carrego dentro mim, lançaram-me um desafio... escrever sobre o dia dos namorados.
Que sei, eu, do amor?! Daquele doce despertar dos sentidos? Daquele bater mais forte do coração? Daquele sorriso transparente que me delata? Daquele que era outrora puro, agora somente momentos fugazes, imprecisos perdidos numa caminhada repleta de infidelidades, falsidades e ausente sinceridade?
Recordo histórias reais. Instantes de toda uma vida, que com voracidade me abraçam e me fazem acreditar que nada está perdido!
O sorriso saudoso do meu rosto é substituído por um riso cristalino!
Na mente, as imagens sucedem-se! A nostalgia cede lugar a uma ténue alegria...
O enredo dos dias atinge-me... e mais uma vez, são os eternos ídolos da minha vida que me relembram que o amor é poesia e, mais que isso, felicidade.
Trinta e oito anos decorridos, o mesmo olhar é partilhado. A mesma cumplicidade. A mesma certeza. Impossível manter-me indiferente... se é através desses dois seres, a quem dedico a forma mais doce de amor e que me conceberam há trinta anos... que tomo plena consciência que o sentimento mais que sonho, ilusão ou antiguidade... é tão intenso e real como a própria vida!
A eles e a todos que hoje celebram o amor relembro... enquanto, timidamente, me apercebo da insipidez de uma vida solitária! Porque sim... Porque gosto... Porque quero!

sábado, fevereiro 12, 2005

44. Beijar é um acto criminoso!




Hoje, já depois de almoçar, enquanto bebia um café, resolvi ler uma das edições nacionais de que sou habitual leitora.

Folheadas meia dúzia de páginas fiquei estupefacta... Por breves segundos imaginei que, por alguma malvadez dos deuses, tivesse dado um salto no tempo. Seria, 1 de Abril, o célebre dia das mentiras?!

“Indonésia proíbe beijos a não casados” um insólito do mundo que nos chega através das palavras de João Vaz, na edição do dia n.º41 da Sábado.

“O jornal Jakarta Post de domingo anuncia que revisão, em curso, das leis deixadas pelos holandeses na Indonésia inclui a proibição do beijo em público a pares não casados oficialmente e a possibilidade da polícia fazer rusgas a casas onde se suspeite haver pessoas em união de facto. O mais popular país muçulmano quer impor bons costumes com multas até 300 mil rupias (25.300 euros) e penas de dez anos de cadeia.”

Em pleno início do século XXI, numa época em que há países a debater a legalização do casamento homossexual e quem, no Canadá, tenha sugerido que as escolas deveriam leccionar uma componente curricular na área da educação pro-homossexual, eis que surge esta notícia!

Reconheço que sou uma pessoa conservadora (q.b.) mas, por mais que tente, tanto me parece ilógico que eduquem crianças com uma visão deturpada, de que “tudo é natural”, como se castrem as demonstrações inatas de amor.

O acto de beijar não será um condenável pecado ou algo sujo e feio, apenas porque não existe um contracto a legalizar a união de duas pessoas. Um mero papel, igual a tantos outros que assinamos ao longo da nossa vida... Semelhante àqueles que nos ligam a uma casa, um carro, uma empresa, ou seja lá o que for!

Será este um caso de impor bons costumes ou, simplesmente, o reflexo de uma mentalidade tacanha, retrógrada e nada inteligente?

Tudo isto leva-me a deixar a pergunta: Se eu beijar, em público, a pessoa a quem amar, serei pior pessoa?! Isso fará de mim um alguém sem valores ou valor?! Uma criminosa, tal qual assassinos disfarçados de políticos que, por puro capricho ganancioso, invadem um país e o submete a uma hipócrita política de genocídio, durante mais de duas décadas?

É chocante... não é?

quarta-feira, fevereiro 09, 2005

43. "Amo-te, sinto-o sem saber..."
Maria Teresa Horta





"Amo-te, sinto-o sem saber à beira das ondas que à minha frente se desdobram, sobem por dentro do seu interior de ónix e em seguida se tecem e enovelam numa vertigem entontecida de sal e de esplendor, se dobram, se encurvam e estendem, vindo por fim desenrolarem-se bruscas a meus pés, espuma branca fazendo de algemas fechadas em torno dos meus tornozelos."

Maria Teresa Horta
In Contos de Verão, Diário de Noticias, 12 Agosto




Amo-te, sinto-o sem saber...
Talvez, sem ter como o reconhecer.
Porque os dias tardam a chegar.
Porque o sonho é menos que amar.
Porque a vida assim o quis!

Amo-te, sinto-o sem saber...
Quando à noite te relembro o rosto.
Sem te dar um nome.
Sem te conhecer o paradeiro.
Sem, sequer, te saber verdadeiro!

Amo-te, sinto-o sem saber...
Nos momentos em que perco o olhar,
Para lá das ondas do mar.
Para lá do horizonte...
Onde navega a essência do meu ser!

Amo-te, sinto-o sem saber...
Enquanto o emaranhado de emoções...
Me assalta a alma...
Me subtrai da realidade,
desnudando a aparente calma.


Mesmo agora em que quase te reconheço
O cheiro... a voz... o toque...
o carinho... o abraço... o beijo...
no doce embalo da madrugada, que não tarda,
continuo, persistente, a acreditar que...

Amo-te, sinto-o... sem saber!

domingo, fevereiro 06, 2005

42. Memórias não apagadas...



Há comentários que nos atingem com a força de mim tormentas. Palavras que nos fazem parar no tempo e deixar o pensamento solto, a marcar compasso, lado a lado, com o coração.

Na quarta-feira escrevi um pequeno conto sobre memórias de uma mãe... uma história entre muitas! Falava de sentimentos... de lembranças e, afinal, de como as pessoas continuam vivas dentro de nós quando as recordamos com amor!

Os comentários não se fizeram demorar...

Ricardo, com assento num outro cantinho da internet, o blog Tá de Noite, é o autor do comentário onde se pode ler um texto de Paulo Geraldo - O André... a história triste de um professor que perde um aluno... um amigo.

Porque me comoveram as palavras?! Recordaram-me amiguitos que perdi quando deixei o meu último trabalho. Meninos e meninas que muitas vezes sofriam maus tratos, dos que deveriam ser os primeiros a defendê-los... que chegavam à sala de aula com os olhos esbugalhados de lágrimas e com a fome a impedi-los de se concentrarem nas actividades. Crianças que perdi porque, infelizmente, temos o país que temos e o ensino é a realidade que se vê. Só assim explica que tenha trabalhado três anos e meio num projecto da Câmara Municipal de Lisboa e nem um contrato tivesse.

Hoje, dois anos e meio volvidos, mantenho contacto com dois ou três desses pequeninos seres. Entretanto cresceram. Transformaram-se em adolescentes conscientes e afáveis. Outros há... cujo paradeiro desconheço.

As recordações vão ressurgindo e não consigo evitar relembrar-me de três rostinhos lindos que foram retirados à guarda da família. Porquê?! Porque para a mãe mais importante que trabalhar, para os sustentar, era passar o dia num café a cheirar a mofo, lá para o lado de S. Bento. Mais importante que dar um simples banho aos filhos era sugar mais um cigarro e esvaziar mais uma cerveja. Mais importante que amar era autodestruir-se e arrastar consigo aqueles seres indefesos e inocentes...
Recordo com tristeza o dia que não os vi entrar a correr pelo pátio. O mesmo em que as suas cadeiras passaram a estar vazias... tal como o coração daquela mãe, sempre estivera! No entanto, se hoje forem felizes, terá valido a pena....

O cepticismo envolve-me sabendo o que sucede, actualmente, nas instituições que albergam estas crianças! Quero ter esperança... e acreditar que lhes está destinado um futuro risonho. Deste modo, atenua-se a sensação de perda... e de impotência!

Na verdade... tudo isto me recorda que, existem muitas formas de se perder as pessoas de quem gostamos. Nem sempre o esfumar dos entes queridos se relaciona com a morte. Acredito que, na maioria das situações, é o simples enredo de uma vida que sabe ser madrasta... o que faz com que os elos físicos se quebrem...

sexta-feira, fevereiro 04, 2005

41. Canto e Castro: O senhor do Teatro


Canto e Castro, Ruy de Carvalho
Rei Lear

Há dias, Fevereiro chegou, quase no mesmo instante em que o coração se contorceu e a mente se esvaiu em mil lembranças... Décadas de afincada paixão! Mil percursos em prol da cultura, da poesia, do sonho...

Há dias, a Basílica vestiu-se de luto e nem o frio impediu o comovido adeus... enquanto se relembrava a doçura da voz rouca, a magia dos gestos, a determinação que lhe era inerente.

A saudade, na hora da despedida e a sensação de perda abraçaram quem acompanhou, mais ou menos atento, o trajecto digno de menção na cultura nacional

Inumeradas as peças que ficaram por ver, os episódios a que não se assistiu, as críticas por ler, visualiza-se mentalmente a emblemática figura do teatro português. Ficam os registos de mais de meio século na memória de uns... na de outros, o carinho sincero de quem, mais do que a máscara, viu o homem; mais do que a personagem... a sensibilidade real de quem a encarnava.

Há dias, a noite desceu sobre a manhã
E a madrugada sobre o entardecer...
Lágrimas brotaram dos olhos anónimos.
Soluços invadiram o peito de quem recorda...
O amigo... o conhecido... o actor,
Esse grande senhor!

quarta-feira, fevereiro 02, 2005

40. Breve história de amor e de mar.

Os últimos dias de Inverno trazem consigo o calor de meia dúzia de raios solares que convidam a deambulações... passeios, caminhadas...
Ivone cede perante o irresistível apelo do mar e retorna à praia... a mesma que durante anos visitara, devotadamente, sempre que o trabalho o permitira
Sentada na areia húmida o pensamento perde-se para lá da rebentação das ondas... Inspira o ar fresco da manhã e, enquanto o vento lhe acaricia a nuca, fecha os olhos. A mente flutua. Recua no tempo. Por momentos, mais envolvida numa doce demência dos sentidos do que na própria recordação, volta a sentir a cálida mão tocar a sua... o fôlego, quente e ritmado, a acercar-se do rosto e a doçura dos lábios de encontro à sua pele.
Por breves instantes, a sua alma abandona o corpo e junta-se à dele partilhando os carinhos de que há muito tem saudades.
A manhã avança neste enredo de sentimentos telepaticamente revelados... de um mundo para o outro. No entanto, o olhar, aparentemente prostrado sobre o azul do mar, nada vê além dos contornos ternos daquele rosto masculino.
A intensidade do que a envolve é indescritível! Sustém a respiração... como se temesse que o leve movimento do seu peito fosse quebrar o encanto do momento.... e levar para longínquas paragens aquele ser tão amado.
O poder dos sentimentos aliado ao da imaginação assume proporções nunca previstas, jamais determinadas! A realidade, essa, está à espreita... preparada para a subtrair do mundo dos fantasmas, numa qualquer hora incerta em que a sua sanidade mental seja colocada em risco.
O sorriso que se desenha nos seus lábios vai-se desvanecendo quando a mente recupera aquela última tarde...
Quantos anos teria?!
Vinte e oito ou vinte e nove... Não mais que isso!
A escassos centímetros, lá estava ele! O sorriso franco e palavras espontâneas.
- Sabes... gosto de ti! – e, abrindo tanto os braços quanto lhe era possível, elevara o tom de voz – Assim!
Um amor puro e distinto abraçava-os com uma força sobrenatural. Mágica... criando um elo que os anos não haveriam de quebrar. A vida ou a morte, a alegria ou a tristeza... ou o que fosse, nunca seriam elementos suficientemente fortes para os afastar! Nem mesmo quando o mar, espectador atento de inúmeros momentos de partilha, modificasse o rumo das suas sinas e sugasse a Rodrigo o último sopro de vida.
Infelizmente, bastara uma fracção de segundos maquiavélicos... um desviar de olhos... um esvair de pensamentos momentâneo... para que fosse pelas águas traiçoeiras arrancado do mundo dos vivos...
Os momentos de outrora transformaram-se em fragmentos da memória mas o amor manteve-se omnipresente.
Ivone mesmo agora, ali sentada, continua a ouvir no silêncio da sua dor... o eco da confissão:

- Sabes...gosto de ti! Mãe...! Assim... MUITO!